Dia Mundial do Livro 2025 olhar cervantino
O Dia Mundial do Livro vai ser comemorado pelo 30º ano seguido, neste 23 de abril. Criado pela UNESCO, em 1995, trata-se de um evento global de inquestionável valor e importância. Une pessoas.
Além das temáticas em torno da literatura, dos livros, do autor e da leitura, em múltiplas atividades, as comemorações deste ano decerto vão considerar o aniversário de 420 anos do Dom Quixote de la Mancha, cujo pai, Miguel de Cervantes, é um dos homenageados permanentes; os outros são William Shakespeare e Garcilaso de la Vega.
Com capacidade sistêmica para agregar ideias e despertar mentes, por meio de lançamento de novas edições e reedições de livros e de debates e troca de ideias, o Dia Mundial do Livro chega vivíssimo ao último ciclo do primeiro quarto do século XXI.
Apesar disso, ao testemunharmos os movimentos sombrios que ultimamente tentam sitiar algumas nações, temos que dar forças à missão principal do Dia Mundial do Livro, a de difundir e incentivar a criação literária e a prática da leitura, recursos essenciais à instrução pessoal e ao desenvolvimento racional da sociedade.
Há muito tempo, não pairam dúvidas, o livro tornou-se, nas diversas modalidades, imprescindível à melhor compreensão dos acontecimentos do passado, do presente e do porvir, e da condição humana e do processo civilizatório. Tal entendimento conduz à afirmação do teólogo e escritor Antonio Manzatto de que “tudo que é humano interessa à literatura” (livro Teologia e Literatura). Mas cruciais são as palavras de Santo Tomás de Aquino, “temo o homem de um só livro” (Timeo hominem unius libri).
Voltando ao livro dos livros. O pioneiro do romance moderno. Fundamental na construção da arte literária. O Quixote completou, no último mês de janeiro, 420 anos de caminhadas, inspirando-nos a lutar por um mundo mais justo e fraterno, e a enfrentar todos os tipos de “gigantes”, a exemplo do maior dos cavaleiros andantes.
Na opinião do escritor Carlos Fuentes, “a modernidade começa no momento em que Dom Quixote sai da sua aldeia, do seu refúgio de livros, e se lança a ver o mundo: sai motivado pela leitura e acaba atuando o seu próprio texto”.
Assim, a história do engenhoso fidalgo é contada, de fato… uma história intrinsecamente livresca. Na companhia do escudeiro Sancho Pança, o Cavaleiro da Triste Figura, nos diálogos com algumas personagens, ao longo dos caminhos, disserta sobre os livros e as letras e sobre o papel do historiador, do prosador e do poeta, provocando um clima motivador àqueles que almejam à escrita.
Portanto, caro leitor, com o estímulo cervantino colocado em pauta, se tens ideias e queres escrever, escreva. À sua maneira. O espaço das letras é largo e democrático. E, sendo bastante improvável a eclosão súbita de genialidades, coisa de outras eras, tome para si que, em absoluto: Ninguém vai ser um novo Dante / Nem um Cervantes. Nunca um Baudelaire / Nem um Flaubert. Jamais um Camões / Nem um Guimarães (o Rosa).
Nesse contexto, é bom saber que, em breve, o admirável cavaleiro e seu fiel escudeiro poderão abraçar o mundo em uma nova circunstância, como fazem no icônico livro cavaleiresco da Mancha. …Recentemente, a junta diretiva da Sociedade Cervantina de Alcázar de San Juan (ES) emitiu um comunicado informando que iniciaram a preparação de um “pleito para que a ONU-UNESCO reconheça e declare
Dom Quixote e Sancho Pança como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade”. A medida mobilizou os ambientes cervantistas. Ela sustenta-se na universalidade e na efetiva presença no imaginário popular e nas artes do “imortal par” (ênfase de Martín Riquer) da obra-prima de Miguel de Cervantes, em todos os continentes. Um detalhe interessante dessa brilhante iniciativa foi uma frase escrita na mensagem da Sociedade, que resume bem o espírito do tema aqui tratado e pode perfeitamente aplicar-se ao cotidiano de nossas vidas: “cada um de nós, levantamos como Quixote pela manhã e deitamos pela noite sentindo-se Sancho”.
Celebremos o Dia Mundial do Livro!
* Da Asociación de Cervantistas, autor do livro “Sonho impossível - O Recife e Cervantes (2024)
([email protected])
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