Educação sem democracia é tragédia anunciada
Nesta quinta-feira (23), o Governo de Pernambuco anunciou que a seleção para as 9.891 vagas das Escolas Técnicas Estaduais (ETEs) se daria por sorteio público eletrônico, não mais pela tradicional prova de admissão. A nova metodologia proposta não é inédita – já é adotada em escolas de aplicação –, mas a forma como a mudança foi instituída, sem diálogo com a comunidade escolar e sem qualquer previsibilidade, provocou uma grande insatisfação nos estudantes, pais e responsáveis.
Anunciada de supetão, a alteração foi recebida com revolta, em especial pelos estudantes que vinham se preparando para a prova. De uma hora para outra, toda a dedicação e abdicação para a prova de admissão em meses de preparação relevou-se em vão. A medida, independente de seu mérito, ou seja, ainda que pudesse surtir efeitos positivos na garantia de maior equidade, tornou-se insustentável. Faltou escuta da comunidade escolar e participação social.
Um dia depois do anúncio, a Secretaria de Educação de Pernambuco voltou atrás e informou que um novo Edital será publicado neste sábado (25), mantendo a prova de admissão como forma de ingresso. No entanto, o episódio deixa uma lição: sem democracia, não há compromisso real com a valorização e popularização da educação básica e técnica.
O histórico das ETEs revela avanços importantes, mas também mostra descuidos recentes. Há 10 anos, Pernambuco contava com apenas 6 unidades de ETEs. Desde então, até a posse da governadora Raquel Lyra, mais de 59 novas unidades foram entregues, ampliando significativamente a rede e a oferta de cursos para a juventude.
No entanto, essa evolução não se refletiu nos últimos anos. Em 2022, estavam disponíveis 9.885 vagas para cursos técnicos. Quatro anos depois, a atual gestão praticamente não ampliou o número, disponibilizando apenas 9.891 vagas — um aumento de apenas seis. Esse dado evidencia a falta de compromisso com a ampliação do acesso à educação profissional, deixando milhares de jovens sem a oportunidade de desenvolver habilidades essenciais para o mercado de trabalho.
O atual governo teve a oportunidade de fazer aceno aos estudantes no tema da popularização do acesso à educação, por exemplo, com o Projeto de Lei que previa a gratuidade da taxa de inscrição do Sistema Seriado de Avaliação (SSA) da UPE para estudantes oriundos de escolas públicas, e não o fez. Faltou - como já vem sendo a marca deste governo - diálogo e construção coletiva, e sobra descaso.
Infelizmente, a marca desse governo para a educação tem sido a parca criação de vagas em creche, ônibus escolares estocados, terrenos adquiridos para comportar equipamentos públicos de educação até então desconhecidos da população e negligência quanto à entrega dos kits e fardamento escolar, fornecimento de merenda de qualidade e garantia de infraestrutura adequada.
Por isso, o movimento estudantil, com a União Metropolitana dos Estudantes Secundaristas (UMES-PE) à frente da mobilização, insiste que o governo deve aproveitar o recuo para rediscutir o tema com a sociedade e a comunidade escolar; investir na ampliação do número de vagas ofertadas nas ETEs, visando à universalização do acesso à educação técnica; fortalecer as ações afirmativas de ingresso nessas instituições; e ampliar a oferta de infraestrutura de qualidade, seja na melhoria das escolas já existentes, seja na construção de novas unidades, assim como na oferta de cursos que contemplem as particularidades culturais, as demandas locais e a empregabilidade dos jovens estudantes.
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