Sex, 05 de Dezembro

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opinião

João Câmara, escritor. E pintor

Pintar é exprimir o mundo. No modo arte. Usando pigmento. E emoção. Conheci Câmara nos anos 70. Oficina Guaianazes. Um grupo de obstinados artistas de Olinda. Criando. E trabalhando reproduções. Depois, outro Câmara, na verdade, o mesmo. Na casa de Neném Brennand. Cenas da vida brasileira. O pintor amadurecia. A república olindense transformou-se na República de Getúlio.

Câmara é um pintor brasileiramente pernambucano. Ele sai de Olinda para voltar. E volta, para ficar. Como escritor. Escrever é contar. Estórias. Memórias. Inventar. Palavras. Como Guimarães Rosa. Criar personagens. Do cotidiano. Prosaicos. Como Paulo Mendes Campos. João Câmara, escritor.

João Câmara, pintor, chega com um stand. Arte. Estandarte. Cores. Vermelhas. Não as de Caravaggio. As do arrebol do Recife. Rubras. Violáceas. Pictóricas. Quase sonoras. Por sua vez, João Câmara, escritor, chega na sutileza. Silente. Beleza escritural. Seus contos são enigmas de gente. Que pensa. Decifrados. Na brisa tropical.

Há homens que criam planetas urbanos. Como Nelson Rodrigues. Brasileiro de Pernambuco. E, lá, ele pôs passeatas, a cabra vadia, a estudante da PUC, bonitinha, mas ordinária, Otto Lara Resende, gols do Fluminense, beijo no asfalto. E os há, rurbanos, como construiu Francisco Brennand. Um planeta, entre cidade e rio. Na mata. Perpetuando o verde. E, lá, colocou templos, sóis, luas, mulheres, argila, poesia, crença, determinação. E lealdades.

Uma das lealdades, Aloísio Magalhães. Certa tarde azul, das de Carlos Pena Filho, Aloísio me levou à Oficina. Na porta do ateliê, disse:
- Francisco de Paula ! Era assim que chamava Brennand.
-  Viva ! Era assim que o escultor respondia, com a conclamação Aloisiana.

Outra lealdade, João Câmara. Que vai lançar mais um livro. De contos: Retábulos, predela. Quinta-feira, 18. No Espaço Brennand. No livro, antes de alcançar o jardim de Câmara, o leitor é recepcionado pela introdução de Sidney Rocha. Nela, Sidney diz: “Este livro pode ser lido de modo isolado ou como parte de um sistema maior, do qual já conhecemos outros elementos: os dois livros anteriores de contos ou, como prefiro chamá-los, os protorromances de João Câmara”.

E continua: “De modo isolado. Até deve. Como cada aba deste retábulo. Suas três partes são dobráveis. Seus personagens se misturam, porque pedestres, suburbanos, gente velha e envelhecendo obtusas. As abas deste retábulo são três contos: Anselmo, Emanuel e Carol”.

Na Introdução, Sidney Rocha avisa que Deus está conosco. E acentua o que realmente está acontecendo aqui. Ressalta inocência versus experiência. E diz que os contos de Câmara lhe fazem voltar à ideia de estar lendo como da primeira vez.

Na contracapa, Weydson Barros Leal diz que “o livro belamente ilustrado pelo autor é um desafio ao leitor que busque algo além do que poderíamos chamar de reencontro com o novo”. A literatura pernambucana do século XXI está nova em folha. E experiente.


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