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opinião

O polvo e a polva

Os antepassados viveram sem a quantidade de informações que chegam hoje até nós, pelas mais variadas formas; notícias boas e ruins, necessárias e supérfluas, engraçadas e tristes. A internet – o maior meio de comunicação atual - não elimina a instrução que vem dos livros, até pela amplitude do material e da bibliografia citada na obra.
 
Trago como exemplo o romance “Crime e Castigo”, de Dostoiévski, séc. XIX, que demorou quase dois anos para ser concluído. Permanece forte, atual, intenso. Foi escrito em uma época em que o que viria mais tarde era fruto da imaginação de videntes, profetas ou pessoas que estavam à frente do tempo, geralmente considerados loucos.

Com a internet e com tudo o que veio a reboque (incluindo a perigosa IA), é possível saber “coisas” que os livros não trazem ou, se trazem, ficam escondidas ou acessíveis a pouquíssimo privilegiados. Uma coisa que não sabia e que me deixou perturbado, dentro dos fenômenos da natureza, é a reprodução assexuada, chamada de partenogênese, na qual a fêmea não precisa de espermatozoides para fecundar os óvulos. 

Esse método de procriação é usado por insetos (abelhas e pulgões), peixes (tubarões e raias), anfíbios (algumas salamandras), répteis (lagartos, víboras e o dragão-de-Komodo) e aves (condores). Se avançar mais patamares e chegar aos seres humanos, os machos descerão dezenas de níveis no grau de importância para a espécie.

Outro dia, “descobri” como o louva-a-deus faz no processo de acasalamento. Ainda durante o ato, a fêmea vai devorando o macho, iniciando pela cabeça. Quando o ato termina, há dois sobreviventes: a fêmea e o descendente deixado pelo falecido no organismo dela. 

As sucuris e as aranhas viúvas-negras também consomem os machos após o acasalamento. Recentemente, soube que a fêmea do polvo faz o mesmo. Os polvos mais sabidos, para não morrerem, cortam o braço (o tentáculo) que foi adaptado para levar os espermatozoides para as fêmeas. Com sorte, podem sobreviver por mais um tempo; caso contrário, servirão de alimento para a fêmea.

Vejo a relação do polvo com a “polva” semelhante à relação do Estado com o cidadão contribuinte. O contribuinte é o polvo e o Estado é a “polva” – que tem a aparência de um leão - e que tira do polvo tudo o que ele pode dar e mais alguma coisa. 

Corre o risco de, esgotado, se ver engolido por quem ele tanto trabalhou, tanto amou. Estou pensando seriamente em ir para um mosteiro, na tentativa de, pelo menos, salvar o coração, as partes íntimas e, claro, a alma.  Fiquei bastante interessado no Montserrat, na Espanha, e na Abadia de Melk, na Áustria.

- polva = o pó de café que fica no fundo da xícara, após o consumo. 

- Põlva (com til no “o”) = município rural, sudeste da Estônia.
 



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