Sobre a tragédia e o Crime Organizado I
No sábado, 27/4/2024, um violento temporal atingiu o Rio Grande do Sul, pegando de surpresa a população gaúcha. As áreas mais atingidas foram os vales dos rios Taquari, Caí, Pardo, Jacuí, Sinos, Gravataí, além do Guaíba, em Porto Alegre. As enchentes registradas no Rio Grande do Sul, entrarão para a história como o maior desastre climático já verificado no Brasil, até os dias atuais. Até agora, já ocorreram 155 mortes e 94 pessoas estão desaparecidas. O Estado ainda contabiliza 806 feridos e 617.390 desabrigados.
Nos boletins divulgados pelo governo de Eduardo Leite (PSDB), a catástrofe afetou mais de 2 milhões de gaúchos. Após duas semanas de atendimento unificado, estratégias específicas começam a ser implementadas, como abrigos destinados a receber mulheres e crianças. Estabelecido o caos, este chamou atenção do Crime Organizado. Com a insegurança sexual, física e patrimonial expostas a altíssimo risco, por força das circunstâncias, por incrível que pareça, as facções criminosas entraram em ação, exercendo o seu malsinado ofício. Com a Brigada Militar e a Polícia Metropolitana impossibilitadas de agir, os delinquentes iniciaram sua atividade deletéria, senão vejamos por amostragem, Em Santa Catarina, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) apreendeu 1 kg de crack e 52 kg de cocaína em um caminhão que levava doações para o Rio Grande do Sul. O motorista foi preso em flagrante. Na quarta-feira, 15/5, o RBS Notícias mostrou a situação de Canoas, na Região Metropolitana, onde 70 mil imóveis ficaram debaixo d'água. Os moradores que tentam salvar o que restou, convivem com o medo da criminalidade. Na última semana, uma longa sequência de tiros foi gravada na região central do município, o terceiro maior do estado, com 347 mil habitantes.
Os moradores chegaram a contratar segurança armada, por nossa conta, porque não vem ninguém aqui na frente. O tiroteio, que nem esse vídeo aí, é toda a noite, toda a noite, diz um morador, que prefere não ser identificado. Também em Canoas, o voluntário paranaense José Carlos Antoncheski Jr. se viu vítima dos criminosos. Ele utilizava um barco para transportar bombeiros e policiais nos resgates a pessoas isoladas. O empresário foi a um supermercado comprar donativos e, quando voltou ao estacionamento, percebeu que o barco havia sido furtado. Câmeras de monitoramento flagraram a saída de um carro rebocando o barco do José. Voluntários se mobilizaram e conseguiram encontrar a embarcação. A Brigada Militar conseguiu prender o autor do furto. Os estelionatários virtuais de plantão, não perderam a oportunidade de participar. Uma operação da Polícia Civil do RS em conjunto com a Polícia de São Paulo, prendeu três delinquentes cibernéticos, que criaram um site para arrecadar dinheiro, imitando a página oficial do governo gaúcho. Numa demonstração de extraordinária capacidade e enfrentamento ao crime, sob condições climáticas e logísticas extremamente desfavoráveis, praticamente, debaixo d’água, as policias do Rio Grande do Sul prenderam 130 criminosos. Deste total, 48 foram pela prática de crimes contra o patrimônio - estelionatos, furtos e roubos. Outros 49 foram detidos em abrigos.
Um dos destaques dessa miríade de práticas criminosas, ocorreu na região do Vale do Taquarí, no município de Arroio do Meio: o furto em uma loja, pertencente à família da empresária Marinez Silva Hauenstein, viralizou nas redes sociais. Olha só o que eles fizeram com a nossa loja de Arroio do Meio. Roubaram, entraram nela. Roubaram tudo. Porque, quando se encontra uma porta chaveada - e ela tá chaveada -, não é saque, é roubo. A família tem cinco lojas, quatro foram destruídas pela água, onde perdemos tudo. Essa, que seria a loja do nosso recomeço, foi roubada por completo, arrematou a empresária. Como se isso não bastasse, a família estima que 20 mil itens foram levados, totalizando um prejuízo de R$ 2 milhões. Marinez só deparou com os estragos alguns dias depois, ao conseguir voltar para Arroio do Meio, depois que as águas baixaram. Isso é muito revoltante, é muito triste. Porque a gente é honesto, a gente é trabalhador. Há também registros de 11 casos de violência sexual, cometidos em abrigos.
Como os estupros são cometidos em ambientes clandestinos, às escondidas, o número deve ser bem maior. Por outro lado, a magnitude da tragédia, atraiu atenção do mundo inteiro e as manifestações de apoio e ajuda se multiplicam chegando de todas as partes do planeta. A empatia se materializa na população a partir de imagens de grande impacto, como resgates de crianças e animais, assinala Fernando Schüler, eminente cientista político.
O resultado positivo da tragédia, há sinais de expressivo crescimento da solidariedade com indicador do surgimento de uma sociedade mais justa e igualitária.
Por final, a noção de solidariedade como um dos pilares da civilização é bem antiga. Afinal, o primeiro corpo de bombeiros voluntários foi criado na Filadélfia em 1736, por ninguém menos de quem: Benjamin Franklin, um dos pais fundadores dos Estados Unidos. É um bom começo; a luta continua. Que Deus nos ajude. Seja o que Ele quiser.
*Advogado
