Uma Cozinha Sertaneja
O espaço físico não tem estilo, mas obedece ao sentido do equilíbrio milenar, herdado dos antepassados sábios. São duas toras de madeira, de tamanho grande, tipo forquilha, que servirão de sustentáculo para receber a cumeeira da linha de madeira, formato de teto, com quatro pedaços de paus, para dar base ao rústico telhado. As toras estão fincadas na terra batida, num formato quadrado. Feita a estrutura que abrigará uma rudimentar cozinha de uma família nordestina, que vive ao pé de uma serra, que ampara o vento, que cobre o sol, que ameniza o calor da pequena moradia. Dentro do quadrado, paredes levantadas com barros enxaiméis.
O fogão é feito de alvenaria, com três buracos, sendo um deles por onde o carvão será colocado e os outros para cozinhar feijão, arroz e torrar toucinho de porco, charque e carne seca. Tudo está impregnado de rusticidade e aconchego. O cheiro se torna característico pelo aroma da comida feita de maneira tão artesanal e tão caprichosa.
Uma jarra grande de barro, colocada no chão, vertida com água dormida e assentada, com uma tampa redonda de madeira, servia para impedir que mosquitos e insetos caíssem e apodrecessem essa água gelada naturalmente e que seria usada para o cozimento dos alimentos.
Uma cadeira dentro da cozinha é usada para que a dona da casa sente e fique de tocaia para que o feijão não queime. O cheiro inunda a casa e avisa a família que, já dentro de casa, aguarda ansiosa, que a matriarca traga a comida cozida, fumegante e gostosa.
Um candeeiro apagado, pendurado na parede, mostra que ele servirá de guia nas noites escuras e amenas daquele recanto da casa sertaneja. A terra batida está limpa, foi varrida com camundango, amarrado com cordão, enfiado num cabo que será usado como vassoura. Um saco de açúcar, vazio, vai servir de toalha e está descansando num torno, perto do fogão. As panelas de barro, fortes e resistentes aguentam o tranco de tanto fogo, dia após dia.
Um arame, acima do fogão, serve de varal para a carne secar, defumada, ela dura dias. Fora da cozinha, numa parede lateral há uma mesa e nela, um balde que serve de apoio para lavar a louça. Na outra parede, encostado nela tem uma pá, uma cadeira, plantas e uma máquina de moer, da marca Mimoso, que é usada para passar milho, carne e outros alimentos.
E esse cheiro da comida que toma a casa durante todo o dia, emendando o café da manhã, com o almoço e o jantar, impregna o roçado e vai caminho afora. Esse cheiro gostoso de comida caseira acorda quem tem fome e chama gente para se alimentar. Daí se entende porque desde outrora essa cozinha, o coração da casa, secular ou moderna é considerada sempre o local mais aconchegante do lar de qualquer família que se reúne a sua volta e festeja o dia que passou e perpetua tão linda tradição.
*Maria Lúcia de Araújo Nogueira, Advogada, e sertaneja.
