Projeto ecológico de tratamento de água do Riacho do Cavouco ganha destaque em feira internacional
Implantado no Parque do Caiara, projeto de Jardim Filtrante da Phytorestore recupera trecho do Riacho do Cavouco com apoio da prefeitura e da ONU
O parque do Caiara, na Iputinga, Zona Oeste do Recife, foi destaque como um dos cases de sucesso em uma das maiores feiras internacionais para água, esgoto, drenagem e soluções em recuperação de resíduos, a IFAT Brasil 2025, que acontece essa semana em São Paulo.
O caso de sucesso é uma idealização da Prefeitura do Recife em parceria com a empresa francesa Phytorestore, que busca soluções baseadas na natureza para o tratamento de água, requalificação urbana e restauração de ecossistemas.
De acordo com Júlia Figueiredo, coordenadora de arquitetura e urbanismo da Phytorestore no Brasil, o projeto implementado no Recife alia tratamento de água e requalificação urbana e atua no riacho do Cavouco, um dos afluentes do rio Capibaribe, principal corpo d' água que corta a cidade.
A tecnologia, já utilizada na Europa, foi aplicada pela primeira vez no Nordeste no Parque do Caiara, onde parte da vazão do Cavouco é tratada com o sistema de Jardins Filtrantes.
“Trouxemos para cá justamente uma versão reduzida dos Jardins Filtrantes para que as pessoas pudessem entender um pouco sobre o funcionamento dessa tecnologia”, explicou Júlia. O sistema é uma patente da Phytorestore, que atua no Brasil desde 2017.
Tratamento ecológico
A técnica usa plantas e substratos para filtrar e depurar a água poluída.
“É uma solução 100% natural. Não usamos aditivo químico nenhum no processo”, afirmou.
No caso do Cavouco, a proposta foi desviar parte do riacho, direcionar essa água para o sistema implantado no parque Caiara e devolvê-la ao Capibaribe em melhores condições.
“A proposta é justamente pegar uma parte da vazão do Riacho do Cavouco, desviar para passar por todo o sistema de jardins filtrantes. Ele foi implantado dentro do Parque do Caiara, que fica bem às margens do Capibaribe. Depois essa vazão tratada retorna ao rio com uma qualidade muito melhor”, detalhou.
Segundo a coordenadora, o sistema simula o funcionamento natural de zonas úmidas, com raízes de macrófitas que realizam filtragem física e biológica da água.
O processo inclui uma lagoa plantada, responsável pela oxigenação da água após a etapa anaeróbica.
Requalificação urbana
Além do impacto ambiental, o projeto mudou a rotina da área.
“Quando a gente fala do Parque do Caiara, é uma área sensível, com vulnerabilidade socioeconômica. Muitas pessoas não visitavam aquele espaço. Com os jardins filtrantes, temos uma área de tratamento de água que não é uma estação de esgoto, isolada e mal cheirosa. A estação de tratamento se torna um parque, com plantas e lugar de vivência em grupo para a comunidade”, contou Júlia
A arquiteta também destacou o uso do local para educação ambiental.
“Tem toda uma atividade de educação socioambiental para explicar por que é importante aplicarmos soluções baseadas na natureza.”
A proposta foi financiada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e pela Agência Recife para Inovação e Estratégia (ARIES), ligada à Prefeitura do Recife.
Modelo replicado
O projeto no Recife se inspira em uma experiência anterior da Phytorestore na França.
“Foi na região metropolitana de Paris, em Nanterre. A gente fez a captação de uma parte do Rio Sena e tratou a água dentro de um parque construído numa antiga área industrial”, lembrou Júlia.
Experiências semelhantes também foram realizadas em Niterói (RJ), na Lagoa de Piratininga, e em centros de empresas do setor da beleza, tratando desde esgoto doméstico até resíduos industriais.
Segundo Júlia, todos os projetos mantêm o conceito central: um espaço paisagístico, aberto à visitação, mas com função de saneamento.
“Estamos falando de uma estação de tratamento de esgoto, mas que é um jardim. Uma área de contemplação, em que as pessoas podem percorrer o entorno. Muito diferente de estações convencionais, que são escondidas, têm cheiro forte e geram vetores como moscas”, disse.
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Eficiência e operação
A coordenadora garante que o sistema atende aos padrões regulatórios.
“Mesmo em picos de entrada, o tratado permanece constante. Atendemos todos os níveis da Conama, que é a principal legislação a nível federal”.
Entre os benefícios destacados estão a criação de nichos ecológicos, fomento à biodiversidade e empregabilidade local.
“Muitos dos nossos sistemas são operados pela própria comunidade do entorno, que é treinada para isso. No caso de Piratininga, os moradores trabalham hoje na operação dos filtros”.
A operação do sistema é simples, baseada em podas regulares e rodízio das células filtrantes. “A visita pode ser mensal ou quinzenal, dependendo do modelo”, explicou.
Expansão para o litoral
Júlia acredita que a tecnologia pode ser uma alternativa para pequenos municípios e áreas litorâneas sem rede de esgoto.
“Você pensa na Praia dos Carneiros, por exemplo. Com grandes hoteis, sem rede de saneamento. Esse sistema pode ser acoplado ao empreendimento para tratar o que é gerado ali, sem poluir o principal atrativo do lugar”, sugeriu.
Ela reforça que soluções como essa ganham relevância frente às metas de universalização do saneamento.
“Tem muitas cidades pequenas em que a estação tradicional inviabiliza o atendimento. O Jardim Filtrante é uma das propostas para suprir essa demanda".
Participação da comunidade
Júlia destacou ainda a importância de incluir os moradores desde o início.
“A gente sempre busca fazer os projetos de forma participativa, para que o programa faça sentido naquele espaço. Isso é fundamental para a perenidade do sistema".
Segundo ela, a integração com o espaço urbano e com as pessoas é o que garante o sucesso da proposta.
“Quando as pessoas entendem o que está acontecendo, conseguem replicar para suas famílias e vizinhos a importância disso. Gera um senso de apropriação muito maior”.

