Suspeito de torturar menina de 4 anos já foi acusado de violência e abuso sexual contra outra menor
Polícia investiga se mãe da criança teve envolvimento no crime, após análise de mensagens de celular trocadas entre ela e seu companheiro
Preso na última sexta-feira, Israel Lima Gomes, de 25 anos, acusado de torturar a enteada de 4 anos, em Paciência, na Zona Oeste do Rio, atuava como vendedor e já respondeu por violência contra a mulher e importunação sexual contra uma criança de 12 anos. Segundo informações da polícia, ele chegou a ficar nu na frente de um menor e perguntou sobre o tamanho do seu órgão genital.
Na audiência de custódia realizada na tarde desta segunda-feira, a juíza Ariadne Villela Lopes avaliou como regular e legal o cumprimento do mandado de prisão temporária de Israel Lima Gomes. O mandado foi expedido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).
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Segundo Felipe Santoro, delegado da 37ª DP (Ilha do Governador) responsável pelo caso, chamou atenção a frieza com que o agressor reagiu ao ser informado sobre sua prisão:
— Ele recebeu a notícia com aparente tranquilidade, alegando surpresa e negando as agressões, chegando a se referir à vítima como “amorzinho”. Essa postura fria e calculista levanta suspeitas sobre um possível perfil psicopata, típico de indivíduos que agem sem empatia, remorso ou qualquer sinal de arrependimento diante da dor causada — descreveu o delegado.
A polícia ainda investiga o envolvimento da mãe da menina no crime, já que mensagens de celular trocadas entre os dois mostram que mulher sabia do que ocorria contra a vítima, que era submetida a sessões prolongadas de tortura.
— O que torna a situação ainda mais cruel é o comportamento da mãe. Em vez de proteger e zelar pela filha, ela agia em defesa do agressor, seu companheiro, mesmo tendo ciência do sofrimento da criança. Agora, ela também está sendo investigada, e o foco é saber se sua omissão foi voluntária ou se agiu sob algum tipo de coação por parte do autor das agressões — disse o delegado.
Para ele, o crime relembra o caso de henry Borel, morto em 2021 após múltiplas agressões. A investigação levou à prisão do ex-médico e ex-vereador Jairo Souza Santos Júnior, o Jairinho, e a mãe de Henry, a professora Monique Medeiros da Costa e Silva, que hoje respondem por tortura e homicídio triplamente qualificado.
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— Há poucos dias de completarmos três anos da promulgação da Lei Henry Borel, de 25 de maio de 2022, me deparo com um caso assustadoramente semelhante ao que originou essa legislação. Mais uma vez, as histórias se repetem: o padrasto alega que a criança caiu da cama e quebrou o braço — disse Santoro.
No entanto, o delegado explica que os laudos apontam para lesões graves no abdômen, incompatíveis com a versão apresentada.
— A mãe afirma que não sabia, diz ter agido por medo. Mas, como em tantos outros casos, a consequência é a mesma: uma criança gravemente ferida, internada em estado crítico, vítima de agressões que se assemelham a sessões de tortura — pontuou Santoro.
Entenda o caso
A criança de quatro anos foi levada às pressas ao Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), na UFRJ, com quadro gravíssimo de perfuração intestinal, fratura no braço e sepse abdominal. Segundo os médicos, a menina chegou ao hospital à beira da morte, após sofrer quatro paradas cardíacas e apresentar vômitos de cor esverdeada, além de múltiplos hematomas por todo o corpo.
Segundo a polícia, outras mães que estavam no Hospital Pediátrico acionaram a força ao se depararem com o estado da vítima ao dar entrada na unidade de saúde. A mãe da menina precisou ser protegida, evitando um linchamento pela demais genitoras presentes. Na delegacia, a responsável negou qualquer tipo de agressão à criança por parte dela e de seu companheiro.
A polícia analisou mensagens de celular trocadas entre a mãe da menina e seu companheiro. Em uma delas, ele chegou a afirmar: “Ela é forte porque estou moldando ela na dor. Fica fraco quando é só amor.” A frase causou indignação entre os investigadores, que classificaram o conteúdo como “evidente prática de tortura”.
A Polícia Civil descobriu ainda que a criança era frequentemente trancada sozinha em banheiros escuros. As agressões, segundo as investigações, eram constantes e sempre camufladas por desculpas como “quedas” ou “acidentes”.
O delegado conta que investiga ainda se as irmãs da vítima, também menores de idade, que moram no mesmo imóvel, podem ter sido vítimas do agressor. A mãe da criança chegou a dizer, em depoimento, que temia morrer caso o denunciasse.
Maus tratos
Conversas extraídas dos celulares revelam ainda outras agressões. A mãe confronta o companheiro: “Eu vi você dando uma joelhada nela só porque ela não queria comer.” Ele retruca com palavrões e negação violenta. A menina também já havia sofrido fratura no braço, que o casal tentou justificar como “queda da cama”. Em outro ponto da conversa, a mãe da criança descreve os sintomas da menina, em seguida diz: “...não posso levar ela na UPA pra não dá merd*”.
A prisão temporária foi decretada com base nos indícios de autoria, na gravidade dos crimes e no risco de fuga do suspeito ou represália às testemunhas. O delegado Santoro ainda ressaltou a importância da denúncia e do registro de ocorrências em casos de suspeita de abuso e maus tratos.
— Mesmo que pareça tarde, ainda assim é fundamental. Só assim conseguimos agir a tempo e impedir que monstros como esse sigam destruindo vidas. O silêncio protege o agressor e condena a vítima — alerta o delegado.
No momento da prisão, o suspeito não ofereceu qualquer tipo de resistência e negou ter agredido a criança. Ele vai responder pelo crime de tortura, um delito hediondo. Segundo o delegado, o caso pode evoluir para tentativa homicídio qualificado.
As investigações e novas diligências estão em andamento, incluindo oitiva das testemunhas e análise do conteúdo extraído de aparelho eletrônico apreendido com o suspeito.

