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Inteligência

Abin pretendia substituir FirstMile por ferramenta mais moderna para monitorar alvos via celular

Em 2021, avaliação do gestor do contrato foi "favorável à substituição da solução por outra de funcionalidade equivalente"

Segundo investigação da PRF, Abin usou o FirstMile para espionar políticos, jornalistas, advogados e adversários do ex-presidente Jair BolsonaroSegundo investigação da PRF, Abin usou o FirstMile para espionar políticos, jornalistas, advogados e adversários do ex-presidente Jair Bolsonaro - Foto: Antonio Cruz

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) estava de olho em uma ferramenta mais moderna para substituir o FirstMile, sistema que rastreava a localização de pessoas e está sob investigação da Polícia Federal. Documentos da Abin mostram que, em 2021, no final do contrato do FirstMile, a instituição já tinha mapeado "bons substitutivos" no mercado e recomendava comprar um novo equipamento.

A utilização do FirstMile durante o governo de Jair Bolsonaro foi revelada pelo Globo em março deste ano e motivou a abertura de um inquérito pela Polícia Federal. A investigação identificou que o programa foi empregado pela Abin para espionar políticos, jornalistas, advogados e adversários do ex-presidente. A ferramenta, fabricada pela israelense Cognyte, é capaz de monitorar a localização de até 10 mil números de celular por ano. Em nota à época, a Abin informou que colabora com as investigações e que afastou os servidores investigados pela PF.

O documento da Abin com a avaliação da substituição do FirstMile foi produzido 11 dias depois do fim do contrato, em maio de 2021, e diz que o programa servia para "vigilância remota de alvos", "dispensando a presença física de agentes operacionais no mesmo ambiente dos alvos".

A análise da Diretoria de Operações de Inteligência da Abin, área responsável pela utilização do FirstMile, defendeu que o FirstMile fosse substituído por outra ferramenta com as mesmas capacidades, destacando o fato de o sistema ter se tornado obsoleto. "A avaliação do gestor do contrato é 'favorável à substituição da solução por outra de funcionalidade equivalente'", diz trecho do documento.

O relatório afirma ainda que o FirstMile era utilizado por uma média de oito integrantes do Departamento de Operações. O número indica que os acessos eram compartilhados entre os agentes, já que o contrato previa a utilização por no máximo cinco pessoas dentro da Abin.

Em entrevista ao Globo em outubro, o diretor-geral da Abin reconheceu que o uso do FirstMile pela agência ficou obsoleto:

— Aquilo, para mim, é brinquedo de criança para o que a inteligência precisa. Pelo pouco que conheço daquela ferramenta, não nos atende — afirmou, acrescentando: — A Abin precisa ter capacidade de buscar dados negados. Isso é típico da atividade de inteligência. Aquilo que não querem me informar e o Brasil precisa saber.

Apesar de o FirstMile estar inativo desde 2021, os dados obtidos com a ferramenta continuam sendo utilizados pela Abin, conforme revelou O Globo.

Em documento enviado ao Tribunal de Contas da União (TCU), Corrêa admitiu o aproveitamento de dados de alvos que haviam sido obtidos a partir do programa FirstMile.

Internamente, a agência tem justificado que o uso das informações do FirstMile em operações atuais tem como alvo terroristas, espiões estrangeiros ou pessoas que oferecem algum risco para a segurança do país. Isso ocorre, por exemplo, em casos em que algum alvo identificado como sendo um agente estrangeiro ainda permanece no país. Portanto, as informações de sua localização obtidas com o FirstMile no passado ainda fazem parte da operação.

Por não tratar de investigação policial, e por não trabalhar com produção convencional de provas, como fazem as polícias, por exemplo, a Abin entende que informações produzidas pelo FirstiMile não precisam ser anuladas e podem ser utilizadas pela atual gestão em situações previstas na legislação.

A utilização de informações obtidas com o FirstMile em operações em andamento também foram o motivo para que os dados fossem enviados sob sigilo ao TCU.

No dia 20 de outubro, a PF realizou uma operação para investigar o uso do programa secreto da Abin. Dois servidores da agência foram presos e cinco afastados.

A ação foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Um dos alvos foi o secretário de Planejamento e Gestão da agência, Paulo Maurício Fortunato Pinto, que estava à frente do setor de operações na época e era o número 3 da Abin na atual gestão. A PF apreendeu US$ 171,8 mil em dinheiro vivo foram apreendidos em sua casa.

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