Após encontros com empresários e religiosos, Tarcísio termina semana sob ataques de Eduardo
Acusado pelo filho do ex-presidente de 'nunca ter ajudado em nada no STF', governador de SP disse que relação com Jair Bolsonaro continua a mesma, com 'gratidão, lealdade e amizade'
Na semana que marcou o retorno a eventos de maior exposição após um período de relativo recolhimento, o governador Tarcísio de Freitas (Republicamos) foi surpreendido na quarta-feira (20) pela divulgação de áudios com ataques do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
O teor das mensagens, ainda que minimizado pelo governador nesta quinta (21), reacende as especulações sobre a viabilidade de uma possível candidatura à Presidência em 2026, como querem representantes do Centrão, ou a disputa ao Palácio dos Bandeirantes, como defendem, agora de forma ainda mais enfática, aliados mais próximos.
Nesta quinta, em compromissos no interior do estado, o governador manteve o estilo equilibrista, com declarações que buscam não desagradar o bolsonarismo, tampouco o centro político:
— Minha relação com o Bolsonaro vai ser como sempre foi: relação de lealdade, de amizade, de gratidão com uma pessoa que eu entendo fez muito pelo Brasil e fez muito por mim. Me abriu a porta, sempre foi muito amigo e eu vou ser amigo, vou estar sempre do lado, vou estar sempre trabalhando para ajudar na medida do possível — afirmou.
Na noite de quarta, ele foi a "estrela" de um jantar oferecido pelo presidente do União Brasil, Antonio Rueda, em Brasília, evento que não contou com a presença de familiares ou representantes do ex-presidente Jair Bolsonaro.
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O encontro teve como motivo principal a oficialização da federação PP-União e reuniu lideranças como os governadores Ronaldo Caiado (União - Goiás), Mauro Mendes (União - Mato Grosso), Jorginho Mello (PL - Santa Catarina), Cláudio Castro (PL - Rio de Janeiro), Romeu Zema (Novo - Minas Gerais) e Ibaneis Rocha (MDB - Distrito Federal).
Em seu discurso, após ser tietado por vários presentes como candidato presidencial, Tarcísio defendeu um plano de atuação em conjunto contra o governo Lula, incluindo frentes nas redes sociais e no Congresso. Apesar de ser o principal nome cortejado para suceder Jair Bolsonaro na direita, o governador paulista, segundo pessoas que participaram do jantar, evitou falar sobre 2026.
No Palácio dos Bandeirantes, o assunto eleição presidencial é tema "proibido" entre os secretários em grupos oficiais de WhatsApp. Segundo auxiliares próximos favoráveis à manutenção do governador no Estado por mais quatro anos, somente com a reeleição seus principais projetos poderão ser entregues, como linhas de metrô e a mudança da administração para o Centro de São Paulo.
Outro fator favorável à reeleição, segundo aliados, será a dificuldade que Tarcísio encontrará para enfrentar Lula e a máquina federal, além de novos prováveis ataques de bolsonaristas-raiz, sobretudo de Eduardo. Na última pesquisa Quaest, divulgada nesta quinta-feira, a rejeição do governador paulista subiu de 33%, na última rodada, em maio, para 39%. Em um cenário eleitoral nacional de primeiro turno ao lado de Lula, o governador de São Paulo aparece com 17%, ante 35% do petista. Para um eventual segundo turno, Lula possui 43% (ante 41% em julho) e Tarcísio, 35% (eram 37% no mês passado).
Enquanto responde sobre as pretensões para 2026 afirmando que pretende continuar em São Paulo, Tarcísio volta, aos poucos, a se movimentar fora do Palácio dos Bandeirantes, fato que não ocorria desde meados de julho, quando o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou um tarifaço contra o Brasil. Após ser criticado pela condução do tema em São Paulo, Tarcísio submergiu, deixou de conceder entrevistas coletivas na capital e reduziu o número de agendas externas.
— Ele fez isso para esperar o assunto esfriar, pois o tema é do governo federal e ele manteve a acertada rotina interna de seguir contra o vento. Isso ocorreu após a reunião com empresários paulistas (em 15 de julho), o que foi um gesto importante – afirma um aliado do governador.
Depois que as críticas cessaram, Tarcísio passou a exercer longas jornadas, com cumprimento de agendas palacianas de dia e eventos noturnos e aos finais de semana. Na noite do dia12, uma terça-feira, foi à casa do cantor Latino, no Jardim Europa, e se encontrou com influenciadores e empresários, entre os quais Flávio Rocha (Riachuelo), Pedro Mota (sócio-diretor da Sawary Jeans), Marcelo Prando (da indústria de termoplásticos) e Rodrigo Inácio de Lima Oliveira (fundador da produtora de funk GR6). Segundo o GLOBO apurou na ocasião, o jantar foi organizado por Latino para que Tarcísio pudesse conversar sobre a situação do país e sobre suas ideias.
Quatro dias depois da 'Festa do Apê', como postou Latino nas redes sociais em analogia à famosa música, Tarcísio pegou um helicóptero para a Fazenda da Boa Vista, em Porto Feliz (SP), a 107 quilômetros da capital. Ali, participou de almoço organizado pelo executivo do Bank of America, Alexandre Bettamio. Estiveram presentes, conforme mostrou o GLOBO, nomes como Rubens Ometto (Cosan), Milton Maluhy (Itaú), Mário Leão (Santander), Alexandre Birman (Azzas), Marcos Molina (Marfrig/BRF), Zeco Auriemo (JHSF) e Roberto Campos Netto (ex-presidente do Banco Central). No cardápio, conversas sobre investimentos públicos e privados, além, claro, de política.
Improvisos calculados
Em parte dos eventos que participa fora dos Bandeirantes, Tarcísio tem levado uma apresentação feita por sua área de comunicação. Na segunda-feira (18), seus 180 minutos de discurso na Igreja Lagoinha de Alphaville, na Grande São Paulo, tiveram um material de apoio escrito e revisado pelo próprio governador na madrugada anterior. Entre passagens bíblicas e realizações de governo, como construção de residências para pessoas desabrigadas pela chuva em São Sebastião, em 2023, Tarcísio citou a infância, a mãe, que foi empregada doméstica, a relação duradoura com a esposa e até seu tratamento contra um câncer ocorrido há mais de vinte anos.
– Deus me abençoou muitas vezes. Será que é impossível o filho de uma empregada doméstica virar governador? Meu pai que me estimulou a fazer engenharia. Consegui entrar, foi um sonho, mas no último ano descobri um câncer. Tive vontade de trancar a matricula. Porém, encontrei um professor de cálculo, que virou para mim e disse que me ajudaria, aliviando faltas. Resultado: me formei com média 9,74 e terminei o curso em primeiro lugar – disse Tarcísio, que citou algumas vezes o nome do ex-presidente Bolsonaro, mas também lembrou de sua ex-chefe Dilma Rousseff, época em que foi diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Denit).
Depois da longa palestra, o governador participou de um jantar oferecido pelo pastor da igreja de Alphaville, André Fernandes. Entre os presentes, estiveram Neymar 'pai', além do cantor Wesley Safadão, aumentando a lista de empresários e personalidades que se encontraram com o governador paulista nas últimas semanas.
Ataques de Eduardo Bolsonaro
Na quarta (20), um relatório da Polícia Federal mostrou diversos diálogos do filho do ex-presidente com seu pai, preso preventivamente em casa por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
– Tarcísio nunca te ajudou em nada no STF. Sempre esteve de braço cruzado vendo você se foder e se aquecendo para 2026 – disse o deputado, em 13 de julho, entre outras citações, na conversa interceptada depois que o celular de seu pai foi apreendido também por determinação de Moraes.
Nesta quinta-feira, o governador, em agenda no interior paulista, colocou panos quentes nas falas de Eduardo.
— Primeiro eu não vou comentar uma conversa privada de pai para filho, é uma conversa privada de pai para filho, é uma questão que só interessa aos dois, e eu não sei nem porque essas conversas foram divulgadas, isso realmente, não vejo interesse público nisso. Segundo, a minha relação com o Bolsonaro vai ser como sempre foi: relação de lealdade, de amizade, de gratidão com uma pessoa que eu entendo fez muito pelo Brasil e fez muito por mim. Me abriu a porta, sempre foi muito amigo e eu vou ser amigo, vou estar sempre do lado, vou estar sempre trabalhando para ajudar na medida do possível — afirmou Tarcísio.
Além da primeira fala de Eduardo, o filho do ex-presidente ainda disse que '"a narrativa de Tarcísio te sucedendo, que já há acordo para isto, está muito forte. Precisamos segurar isso para nos mantermos vivos aqui”, afirmou o deputado. Segundo pessoas próximas ao governador paulista, a tática de evitar atritos diretos com Eduardo Bolsonaro vai continuar.

