Demissão de Lupi após fraude do INSS desagrada ala do PDT, que avalia relação com governo Lula
Pressionada por encolhimento, bancada mostra incômodo com tratamento ao presidente da sigla. Crítico ao PT, Ciro reage à troca: 'indignidade inexplicável'
Brigando para reverter uma trajetória recente de encolhimento, o PDT reavalia a relação com o governo Lula (PT) após a demissão do ex-ministro da Previdência, Carlos Lupi, na esteira de uma investigação de supostas fraudes praticadas por entidades conveniadas pelo INSS.
A saída de Lupi despertou incômodo na bancada do partido, que costuma aderir majoritariamente ao governo na Câmara, e também gerou críticas do ex-presidenciável Ciro Gomes, que vem se colocando de forma oposicionista ao PT.
Apesar da troca na Previdência ampliar a pressão interna por distanciamento em relação a Lula, a aposta do PDT por sobrevivência eleitoral em 2026 passa por uma federação com outros partidos da base petista, em especial o PSB. Os próximos passos serão conduzidos diretamente por Lupi, que retorna à presidência do partido após a demissão do governo — ele havia se licenciado do cargo, que ocupa desde a morte de Leonel Brizola em 2004, para assumir o ministério.
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O deputado federal André Figueiredo (PDT-CE), que dirigiu o partido interinamente nos últimos dois anos, afirmou que “a princípio não há rompimento”, mas que a discussão sobre o relacionamento com o governo “vai acontecer mais cedo ou mais tarde”.
— Realmente deixou bastante incômodo na bancada a maneira como Lupi foi tratado. Wolney tem amizade muito forte com Lula há muito tempo, e é uma pessoa querida de todos nós (deputados do PDT), mas a indicação dele não passou pelo partido — afirmou Figueiredo.
Divergência interna
Ciro, que manteve relação amigável com Lupi mesmo com a entrada do PDT no governo Lula após as eleições de 2022, reagiu à nomeação de Wolney como novo ministro chamando a situação de “indignidade inexplicável”. A manifestação de Ciro ocorreu em um comentário nas redes sociais do próprio partido, que anunciava a troca no ministério:
“Estou muito envergonhado! Isto é uma indignidade inexplicável”, escreveu Ciro.
O novo ministro, ex-deputado pelo PDT por Pernambuco, desagradou Ciro em 2022 por não se engajar na campanha do presidenciável do partido. À época, Wolney mostrou simpatia pela candidatura de Lula, e posteriormente fez parte do gabinete de transição após a vitória do PT na eleição presidencial.
A postura oposicionista de Ciro em relação ao governo Lula é minoritária, mas integrantes do PDT avaliam que o ex-presidenciável segue se movimentando na tentativa de influenciar os rumos do partido. Há cerca de um mês, por exemplo, Ciro participou de uma reunião com a bancada da sigla em Brasília.
No início do ano, Lupi fez um afago a um dos principais aliados de Ciro na sigla, o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio, e o incentivou a construir uma chapa para disputar a próxima eleição ao governo do Ceará, contra o PT.
Ciro já descartou publicamente a possibilidade de se lançar novamente à Presidência, após ter colhido em 2022 seu pior desempenho em quatro tentativas, com 3% dos votos válidos. Figueiredo, no entanto, afirma que o partido “sabe que Ciro não foge de nenhuma missão”.
Em 2018, quando Ciro marcou 12% no primeiro turno da eleição presidencial, o PDT elegeu 28 deputados. Foram os melhores números do partido no pós-Brizola, principal liderança e fundador do PDT. Em 2022, com uma candidatura pouco competitiva de Ciro, o partido também encolheu na Câmara, fazendo 17 cadeiras.
O desempenho deixa o PDT sob risco de não superar a cláusula de barreira, que exigirá ao menos 13 deputados eleitos em 2026, distribuídos por um mínimo de nove estados, para que os partidos mantenham acesso a recursos públicos e ao tempo de propaganda em rádio e TV.
Um sinal amarelo se acendeu nas eleições municipais do ano passado, quando o PDT viu seu número de prefeitos eleitos cair pela metade, na comparação com 2020, e perdeu ainda as duas capitais que governava, Fortaleza (CE) e Aracaju (SE).
Na tentativa de se afastar da faixa de corte, Lupi entabulou conversas com partidos como PSB, do vice-presidente Geraldo Alckmin, e com o Cidadania para discutir a criação de uma nova federação. No início do ano, quando ainda estava no governo, Lupi chegou a ventilar a possibilidade de uma federação com o próprio PT, hipótese que incomoda a ala mais ligada a Ciro.
No caso do PSB, um dos entraves à federação é o fato de o partido ter contribuído para a desidratação do PDT no Ceará. Irmão de Ciro, o senador Cid Gomes (PSB-CE) deixou o PDT após atritos familiares nas eleições de 2022 e levou consigo para o PSB, desde o ano passado, quase 40 prefeitos cearenses e uma dezena de deputados estaduais ex-pedetistas.
Na semana passada, em congresso do PSB no Ceará, Cid também convidou quatro deputados federais do PDT a tomarem o mesmo caminho; o partido já espera perder ao menos dois. No mesmo evento, o senador fez um aceno ao irmão afirmando que “jamais estará em lado oposto ao de Ciro na questão nacional”.

