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Julgamento da trama golpista: militares de alta patente sentam pela primeira vez no banco dos réus

Integrantes das Forças Armadas são considerados peças centrais da trama golpista que atuou para impedir a posse de Lula e manter Bolsonaro no poder após a derrota de 2022

O único chefe das Forças que teria aceitado dar apoio ao plano golpista foi o almirante Almir Garnier, ex-chefe da MarinhaO único chefe das Forças que teria aceitado dar apoio ao plano golpista foi o almirante Almir Garnier, ex-chefe da Marinha - Foto: Gustavo Moreno/STF

Pela primeira vez na História, militares de alta patente das Forças Armadas serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal ( STF). O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que começa nesta terça-feira, envolve também militares do núcleo considerado central da trama golpista que atuou para impedir a posse do presidente Lula e manter Bolsonaro no poder após a derrota de 2022.

Os réus respondem por acusações como tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada e outros crimes. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), eles integravam a cúpula responsável por dar viabilidade ao plano de ruptura institucional. Todos, no entanto, negam participação em qualquer ato golpista.

No mesmo grupo que Bolsonaro, chamado de "núcleo crucial" da trama, segundo a PGR, estão três generais e um almirante de esquadra, a mais alta patente de oficial general na Marinha.

O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, é peça-chave do esquema, sendo o único a firmar acordo de colaboração premiada. Segundo a PGR, Cid funcionava como elo entre o ex-presidente e outros envolvidos, participando de reuniões e mantendo diálogo com outros militares réus por tentativa de golpe. Sua defesa sustenta que a acusação da PGR está "contaminada por excessos, suposições e narrativas que dispensam a prova e atropelam garantias".

 

Entre os generais está Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa e ex-comandante do Exército. Conforme a acusação, ele atuou para ajudar a descredibilizar as urnas eletrônicas e apresentou uma minuta de decreto com teor golpista em uma reunião com os chefes das Três Forças Armadas, em 14 de dezembro de 2022, na sede do Ministério da Defesa. Ele diz ser inocente das acusações e que trabalhou para demover o presidente de qualquer medida de exceção.

O único chefe das Forças que teria aceitado dar apoio ao plano golpista foi o almirante Almir Garnier, ex-chefe da Marinha. Depoimentos dos outros dois comandantes, Freire Gomes (Exército) e Baptista Júnior (Aeronáutica), apontam que ele teria colocado as tropas à disposição de uma tentativa de golpe. A defesa do militar, por sua vez, nega o fato e pede que ele seja absolvido.

Candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022 e ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, o general Braga Netto também figura entre os réus. Ele está preso preventivamente desde dezembro de 2024, acusado de obstrução de Justiça. Segundo as investigações, seu apartamento em Brasília teria sediado reuniões para planejamento de ações golpistas, incluindo a chamada operação Punhal Verde e Amarelo, que previa ataques a autoridades como o ministro Alexandre de Moraes, o presidente Lula e o vice Geraldo Alckmin.

A defesa de Braga Netto nega todas as acusações, diz que não há provas de que ele tenha articulado ou contribuído com fatos que culminaram nos atos de 8 de janeiro de 2023, e ainda apontaram imparcialidade do ministro Moraes, relator do caso.

O último general réu por participação na trama golpista a ser julgado no mesmo núcleo que Bolsonaro é Augusto Heleno, que comandava o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e foi figura próxima de Bolsonaro ao longo de todo o governo. Documentos apreendidos pela PF com Heleno revelaram tentativas de legitimar o descumprimento de ordens judiciais por meio de pareceres da Advocacia-Geral da União (AGU), aponta a PGR.

“As anotações e falas públicas de Augusto Heleno, ao longo do governo Bolsonaro, não deixam dúvidas de sua inclinação a ideias que desafiam a harmonia institucional e promovem o acirramento entre os Poderes. Mais do que simples abstrações, comprovou-se que Augusto Heleno efetivamente direcionou o aparato estatal em torno de suas concepções antidemocráticas”, ressaltou a acusação.

A defesa de Heleno, por sua vez, afirmou que não há qualquer prova de que ele tenha participado, incentivado ou apoiado ações voltadas à ruptura institucional e que o militar se distanciou de Bolsonaro a partir do segundo ano de governo, com a aproximação do Executivo aos partidos do chamado “Centrão”.

22 militares réus
No total, o Supremo tornou 22 militares réus no processo da trama golpista. Apenas dois denunciados pela PGR se livraram, o coronel da reserva Cleverson Ney Magalhães e o general Nilton Diniz Rodrigues. Os ministros entenderam que não havia indícios suficientes para mantê-los no processo.

Dentre os fardados, há um grupo de destaque na investigação, os chamados “kids pretos”, que são os militares do Exército que integraram o Batalhão de Forças Especiais. O grupo teria colocado em prática planos golpistas, como o planejamento de prisão e morte de Moraes. O inquérito da PF mostrou que os kids pretos chegaram a monitorar o ministro.

O general Mario Fernandes, que integrava o grupo, admitiu em depoimento ter sido o autor do documento que ficou conhecido como “Plano Punhal Verde e Amarelo”. O texto traçava cenários para o assassinato, em 2022, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal da trama golpista. No STF, Fernandes tentou afastar a ideia de que o plano tivesse objetivo prático, disse que imprimiu o material no Palácio do Planalto apenas para leitura pessoal e que logo em seguida o rasgou. Ele integra o núcleo 2, acusado de disseminar desinformação e ataques a instituições.

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