Prisão em seis atos: a cronologia que levou Bolsonaro à prisão domiciliar, do tarifaço a lives
Ex-presidente é réu em ação penal no STF por golpe de Estado e teve prisão domiciliar decretada por Alexandre de Moraes
A mais recente escalada promovida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao se insurgir contra medidas impostas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes se delineou após o anúncio do tarifaço imposto pelo presidente americano Donald Trump a produtos brasileiros. Confira a cronologia dos fatos.
1. Busca e apreensão contra Bolsonaro e tornozeleira eletrônica
Em 18 de julho, nove dias após o anúncio do tarifaço americano, Moraes determinou que a Polícia Federal realizasse uma operação de busca e apreensão na casa de Bolsonaro e impôs ao ex-presidente medidas restritivas.
A decisão impôs ao ex-presidente o recolhimento domiciliar noturno, a proibição de usar redes sociais diretamente ou por meio de terceiros, a vedação de se comunicar com diplomatas e réus da ação penal da trama golpista, e o uso de tornozeleira eletrônica.
A motivação da denúncia de Moraes era a existência de suspeitas de cometimento dos crimes de coação no curso do processo, obstrução à Justiça e ataque à soberania nacional por Bolsonaro, seu filho Eduardo Bolsonaro e pelo blogueiro bolsonarista Paulo Figueiredo. Em sua decisão, Moraes afirma que eles têm atuado para interferir no curso da ação da trama golpista por meio de uma ação coordenada nos Estados Unidos.
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O ministro ressaltou que na representação, a PF verificou um alinhamento das condutas de Bolsonaro e seu filho na tentativa de "criar entraves econômicos nas relações comerciais entre os Estados Unidos da América e o Brasil", com o objetivo de criar obstáculos para o regular prosseguimento da ação penal da trama golpista, que pode condenar o ex-presidente a até 43 anos de prisão.
Ao anunciar que a decisão de impor tarifas de 50% sobre a importação de produtos brasileiros, o presidente dos EUA, Donald Trump, falou que o julgamento de Bolsonaro no STF era uma "vergonha internacional" e usou a ação penal da trama golpista, na qual Bolsonaro é réu como uma das motivações do tarifaço, que foi formalizado na semana passada.
Moraes cita ainda que a PF também identificou o risco de fuga de Bolsonaro do Brasil. Durante a operação, foram apreendidos US$ 14 mil na residência do ex-presidente em Brasília.
2. Polêmica sobre descumprimento da cautelar
No mesmo dia da decisão de Moraes que lhe impôs medidas restritivas, o ex-presidente Bolsonaro deu uma série de entrevistas e declarações que foram transmitidas em redes sociais.
Entre as falas, Bolsonaro afirmou que era alvo de “perseguição” e defendeu a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de elevar as tarifas contra produtos brasileiros.
No dia 21 de julho, após Bolsonaro ter comparecido à Câmara dos Deputados e dar declarações transmitidas por redes sociais e pela imprensa, Moraes determinou que a defesa do ex-presidente explicasse em até 24 horas se ele havia descumprido as medidas restritivas.
A decisão do ministro foi motivada por publicações nas redes sociais nas quais Bolsonaro aparece exibindo a tornozeleira eletrônica, o que configuraria burla às determinações judiciais de não utilizar redes, ainda que por meio de terceiros, de acordo com o ministro.
Em sua decisão, Moraes disse que já havia esclarecido, também no dia 21 de julho, que a medida cautelar de proibição de utilização de redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros, "inclui, obviamente, as transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros, não podendo o investigado se valer desses meios para burlar a medida, sob pena de imediata revogação e decretação da prisão".
No dia seguinte, a defesa de Bolsonaro negou ao STF que houvesse descumprimento de medidas cautelares. Segundo os advogados, a replicação de declarações e entrevistas do ex-mandatário em redes sociais de terceiros, hipótese considerada pelo magistrado como burla à ordem judicial, foge ao seu controle. Entre as restrições impostas ao ex-mandatário está o uso de plataformas, mesmo que indiretamente.
Em uma manifestação de cinco páginas, os advogados disseram que Bolsonaro "jamais cogitou que estava proibido de conceder entrevistas", mesmo que essas declarações possam acabar sendo replicadas em redes sociais. A defesa ainda pediu a Moraes que esclarecesse se o ex-presidente está impedido de conceder entrevistas "a fim de que não haja qualquer equívoco na compreensão da extensão pretendida pela medida cautelar imposta".
3. Moraes decide não decretar prisão de Bolsonaro
Três dias depois, em 24 de julho, Moraes considerou que Bolsonaro descumpriu restrições impostas a ele, mas disse em decisão que não decretaria a prisão preventiva por entender que foi uma "irregularidade isolada".
Na manifestação divulgada em 24 de julho, o magistrado disse que o ex-presidente não está proibido de conceder entrevistas ou de dar declarações públicas, em resposta a questionamentos feitos pela defesa sobre a divulgação de falas do ex-mandatário em redes sociais de terceiros.
"Efetivamente, não há dúvidas de que houve descumprimento da medida cautelar imposta, uma vez que, as redes sociais do investigado EDUARDO NANTES BOLSONARO foram utilizadas à favor de JAIR MESSIAS BOLSONARO dentro do ilícito modus operandi já descrito", escreveu Moraes.
Ao falar sobre os motivos que levaram à compreensão de que Bolsonaro descumpriu as medidas cautelares, o ministro cita como exemplo a veiculação pelas redes sociais de Eduardo Bolsonaro do discurso proferido pelo ex-presidente na Câmara dos Deputados, "momentos após o acontecimento". "Constata-se a tentativa de burlar a medida cautelar, demonstrando a utilização do ilícito modus operandi anteriormente citado", diz Moraes.
4. Bolsonaro adota o silêncio momentaneamente
Após a manifestação de Moraes em 24 de julho, Bolsonaro seguiu por alguns dias a orientação de sua defesa no sentido de não dar declarações públicas e limitar ao máximo suas aparições, apesar de poder dar entrevistas.
Por exemplo, após a deputada Carla Zambelli foi presa, Bolsonaro foi questionado pelo GLOBO sobre o caso e evitou responder diretamente. Em vez disso, ironizou: — Tem censura no Brasil ou não?
5. Bolsonaro em lives
Após as medidas restritivas, apoiadores de Bolsonaro organizaram atos em seu apoio neste final de semana em Copacabana, na Zona Sul do Rio, e na Avenida Paulista, em São Paulo.
Em um vídeo postado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o ex-presidente mandou uma mensagem aos manifestantes que estavam em Copacana, na Zona Sul, do Rio de Janeiro.
“Boa tarde, Copacabana. Boa tarde, meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos”, disse Bolsonaro na gravação, que depois foi apagada por Flávio.
Além disso, o ex-presidente participou de uma ligação feita por chamada de vídeo com o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) durante o ato bolsonarista na Avenida Paulista. O parlamentar exibiu o celular durante o protesto.
— Bolsonaro não pode falar, mas pode ver — disse Ferreira, na ocasião.
6. Prisão domiciliar
Em resposta ao que considerou o descumprimento das cautelares por Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes decretou sua prisão domiciliar nesta segunda-feira.
Na decisão, Moraes afirmou que Bolsonaro incorreu em dois crimes - um de obstrução de Justiça por "coação no curso do processo" (artigo 344 do Código Penal) e o outro de "obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa" - art. 2 da Lei 12.850/13).
"Não há dúvidas de que houve o descumprimento da medida cautelar imposta a Jair Messias Bolsonaro, pois o réu produziu material para publicação nas redes sociais de seus três filhos e de todos os seus seguidores e apoiadores políticos, com claro conteúdo de inventivo e instigação a ataques ao Supremo Tribunal Federal", escreveu o ministro.
"O flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, com a finalidade de omitir a transgressão legal", afirmou Moraes.

