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LEGISLATIVO

Senado aprova projeto Antifacção com verbas de até R$ 30 bi das bets e penas mais duras para chefes

Como foi alterado, o texto do projeto Antifacção agora volta para uma nova votação da Câmara

Projeto Antifacção recebeu 64 votos favoráveis e nenhum contrário no SenadoProjeto Antifacção recebeu 64 votos favoráveis e nenhum contrário no Senado - Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

O Senado aprovou nesta quarta-feira, com 64 votos favoráveis e nenhum contrário, o projeto Antifacção, que institui um marco legal de combate ao crime organizado, endurece penas para facções e milícias e cria uma nova contribuição sobre casas de apostas para financiar ações de segurança pública e o sistema prisional.

A estimativa do relator, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), é que a Cide-Bets possa gerar até R$ 30 bilhões por ano para operações de inteligência, estruturas integradas de repressão e presídios federais.

Como foi alterada, a iniciativa agora volta para uma nova votação da Câmara. Na outra Casa Legislativa, o texto deverá ser relatado pelo deputado Guilherme Derrite (PP-SP), ex-secretário de Segurança Pública do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Derrite foi o responsável pela versão do parecer que já havia sido aprovada pela Câmara em novembro.

O projeto é de autoria do governo, mas o Palácio do Planalto se posicionou contra o relatório de Derrite que foi aprovado pelos deputados. Entre as principais queixas estavam questões relacionadas ao financiamento da Polícia Federal e a sobreposição de leis diferentes para combater o crime organizado.

Esses pontos foram ajustados por Alessandro Vieira e a iniciativa contou com o apoio da base do governo no Senado. A oposição também apoiou. Nenhuma bancada orientou contra.

Mais cedo nesta quarta, o projeto havia sido aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado. O texto aprovado consolida e altera dispositivos do Código Penal, do Código de Processo Penal, da Lei de Organizações Criminosas e de leis de execução penal, drogas, armas, lavagem de dinheiro e crimes hediondos para enfrentar o crime organizado, com foco em três eixos: endurecimento penal contra lideranças, modernização dos meios de investigação e asfixia financeira de facções e milícias.

Vieira manteve a Cide-Bets como fonte central de financiamento, mas fez mudanças hoje para reforçar o papel de estados, Ministério Público e Judiciário na governança dos recursos.

O texto passou a prever que ao menos 60% da arrecadação da Cide-Bets será executada de forma descentralizada, por meio dos mecanismos de transferência já previstos em lei, inclusive fundo a fundo, desde que os recursos sejam mantidos em conta específica dos fundos estaduais de segurança pública, carimbados exclusivamente para ações contra o crime organizado e expansão e qualificação do sistema prisional.

O Conselho Gestor do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) também foi redesenhado, com a inclusão de dois representantes do Ministério Público — um dos MPs estaduais e outro do Ministério Público da União — e dois representantes do Poder Judiciário, garantindo participação federal e estadual. Além das polícias, passam a ser beneficiários explícitos dos novos recursos os Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECOs).

No eixo tributário, o relatório criou uma Declaração Única de Regularização para o setor de apostas de quota fixa, permitindo que operadores que atuaram no país sem autorização regularizem débitos de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins dos últimos cinco anos, sob regras de pagamento específicas e com sanções robustas para quem não aderir ou omitir informações.

Ao mesmo tempo, o texto autoriza o bloqueio de contas de operadores irregulares, veda novas transações e destina ao FNSP os valores declarados perdidos em favor da União.

No plano penal, o projeto cria o tipo de “facção criminosa”, inserido diretamente na Lei de Organizações Criminosas. Promover, constituir, financiar ou integrar facção criminosa passa a ter pena de 15 a 30 anos de reclusão, além das penas correspondentes a outros crimes praticados.

Para quem exerce comando, individual ou coletivo, a pena é aplicada em dobro. As condutas são consideradas hediondas e insuscetíveis de anistia, graça, indulto, fiança e livramento condicional.

O texto define facção como a organização criminosa que atua mediante controle territorial ou com atuação interestadual usando violência, coação, ameaça ou outros meios intimidatórios.

O conceito de controle de territórios foi detalhado para incluir a conduta reiterada de impedir ou dificultar a circulação de pessoas, o funcionamento de serviços públicos, a operação de equipamentos essenciais e de infraestrutura, como telecomunicações e transportes.

As milícias privadas são equiparadas às facções para todos os fins legais. Além disso, o relatório cria um tipo penal específico de favorecimento a facção ou milícia — que inclui dar abrigo, fornecer bens ou informações, disseminar conteúdo de recrutamento ou alegar falsamente pertencer ao grupo para intimidar terceiros — com penas de 8 a 15 anos.

O endurecimento se concentra nas lideranças. Em cenários de maior gravidade, somando-se as penas previstas para facção criminosa, homicídios, roubos, extorsões e outras condutas praticadas em contexto de organização criminosa, a pena em abstrato pode chegar a 120 anos, embora o limite de cumprimento no Brasil permaneça em 40 anos.

Vieira também incorporou novas hipóteses de aumento de pena e tipos penais. Entre as mudanças, está a previsão de causa de aumento para casos de lesão corporal ou morte de militares das Forças Armadas no contexto de atuação de organizações criminosas.

Outra agravante passa a valer quando facções ou milícias interrompem portos, aeroportos, rodovias, estações e linhas férreas, afetando funcionamento, operação, circulação, acesso ou integridade, ainda que temporariamente — ponto incluído diante da escalada de ataques a serviços de infraestrutura.

O relatório também cria um crime específico de receptação ligada ao crime organizado, com pena de 6 a 10 anos, e um novo tipo para quem recrutar, aliciar, cooptar, financiar ou incentivar crianças e adolescentes a auxiliar organizações criminosas, inclusive por meios digitais.

Nesse caso, a pena varia de 5 a 10 anos, podendo subir para 8 a 15 anos se houver lesão grave e para 15 a 30 anos em caso de morte.

O que muda com o PL Antifacção

Cide-Bets e financiamento

Incide sobre as transferências feitas por apostadores às plataformas de apostas (não sobre lucro das empresas).

Alíquota de 15%, com estimativa de até R$ 30 bilhões anuais.

Pelo menos 60% dos recursos serão executados por estados, via fundos de segurança pública.

Governança e controle dos recursos

Conselho Gestor do FNSP passa a incluir representantes do Ministério Público e do Poder Judiciário.

GAECOs entram como beneficiários explícitos do financiamento.

Operadores irregulares de apostas podem ter contas bloqueadas e valores perdidos para o FNSP.

Regularização do setor de apostas

Criação de Declaração Única de Regularização para empresas que atuaram sem autorização.

Permite quitar débitos de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins dos últimos cinco anos.

Prevê sanções severas para omissões ou novas irregularidades.

Criação do tipo penal de facção criminosa

Pena de 15 a 30 anos para integrar, financiar ou promover facção criminosa.

Pena em dobro para quem exerce comando.

Conduta considerada hedionda, sem possibilidade de anistia, graça, indulto, fiança ou livramento.

Definições e enquadramentos
Facção passa a ser definida por controle territorial, intimidação, violência e atuação interestadual.

Milícias são equiparadas às facções para todos os fins legais.

Favorecimento a facção ou milícia

Novo crime para quem dá abrigo, fornece bens, auxilia ou dissemina conteúdo de recrutamento.

Penas de 8 a 15 anos.

Agravantes e penas elevadas
Penas podem atingir mais de 100 anos em abstrato, embora o limite de cumprimento seja de 40 anos.

Agravante para lesão corporal ou morte de militares das Forças Armadas.

Agravante para interrupção de portos, aeroportos, rodovias, estações e ferrovias.

Novos crimes específicos

Receptação ligada ao crime organizado: pena de 6 a 10 anos.

Recrutamento ou aliciamento de crianças e adolescentes:

5 a 10 anos;

8 a 15 anos em caso de lesão grave;

15 a 30 anos em caso de morte.

Investigação e medidas processuais

Ampliação do acesso a bases de dados por MP e polícias.

Regras mais rígidas para continuidade de inquéritos e aplicação de multas por descumprimento de ordens judiciais.

Proteção reforçada a jurados, com sigilo e uso ampliado de videoconferência.

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