Duolingo aposta em IA e dobra número de cursos, mesmo sob críticas
Nova leva de cursos inclui japonês, coreano e chinês para falantes de português e espanhol
O Duolingo mais que dobrou o número de cursos disponíveis ao lançar 148 novas opções com o auxílio de inteligência artificial generativa. A iniciativa faz parte de uma estratégia “AI-first”(ou 'IA-primeiro', em tradução livre) que acelera a criação de conteúdo, mas também levanta preocupações sobre a qualidade do ensino e o impacto da tecnologia no emprego humano.
Na semana passada, o Duolingo sinalizou que essa abordagem está ajudando a expandir de forma mais rápida seus cursos de aprendizado de idiomas, ainda que coloque a empresa no centro de um debate acalorado sobre o impacto da IA no mercado de trabalho e na qualidade do conteúdo produzido com essa tecnologia.
A empresa está lançando 148 novos cursos desenvolvidos com a ajuda de IA generativa — mais que dobrando o número de cursos de idiomas em um ano. Falantes de espanhol, português e línguas europeias agora podem aprender japonês, coreano e chinês. E pessoas que falam línguas asiáticas poderão aprender os idiomas não-ingleses mais populares. Os novos cursos cobrem, principalmente, níveis iniciantes, com conteúdo mais avançado previsto para ser lançado ao longo do ano.
“Levamos cerca de 12 anos para desenvolver nossos primeiros 100 cursos,” disse o cofundador e CEO Luis von Ahn em comunicado à Bloomberg News. “Com a ajuda da IA, conseguimos criar novos conteúdos que melhoram o aprendizado em uma escala e velocidade nunca antes vistas.”
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O anúncio vem dois dias após a divulgação de um e-mail interno no qual o CEO chama o uso da IA para acelerar a criação de conteúdo de “uma das melhores decisões que tomamos recentemente”, mesmo que isso implique em “pequenas perdas ocasionais na qualidade.” Em janeiro passado, o Duolingo cortou 10% dos contratos temporários para acompanhar a mudança, e Luis continuou reforçando a estratégia “AI-first”, que visa reduzir tarefas repetitivas.
Ele afirmou que outras áreas do negócio precisarão aumentar o uso de IA, enquanto a empresa irá “gradualmente parar” de usar prestadores de serviço para tarefas que a IA possa realizar. A contratação de pessoas só ocorrerá quando uma equipe não puder automatizar ainda mais seu trabalho, acrescentou.
Embora os investimentos em IA tenham reduzido a margem bruta da empresa no quarto trimestre, analistas — como os da Needham — descreveram isso como “uma dor de curto prazo”, que investidores otimistas estavam dispostos a aceitar.
A empresa também afirmou que os novos recursos pagos impulsionados por IA ajudaram a atrair assinantes em um ritmo recorde, contribuindo para uma projeção de vendas melhor do que o esperado para o ano. (Os resultados do primeiro trimestre devem ser divulgados na quinta-feira.)
Mas alguns usuários estão reagindo negativamente à mudança para IA, expressando frustração com a preferência da empresa por quantidade em vez de qualidade — a ponto de ameaçarem cancelar suas assinaturas.
“Isso me deixa triste porque percebi mudanças no app e elas não são boas,” comentou um usuário no LinkedIn, em resposta a uma publicação da empresa. “Os exercícios de fala e escrita estão marcando minhas respostas como erradas, quando antes não marcavam. O curso de japonês era muito melhor antes dessa bagunça com IA. Tragam de volta os humanos.”
“Estou cada vez mais insatisfeito com todas as frases pouco naturais e a falta de conteúdo e conversas com situações da vida real,” escreveu outro.
Um porta-voz do Duolingo afirmou que profissionais humanos ainda estão envolvidos na criação de conteúdo, especialmente em funções especializadas em idiomas. “Testamos rigorosamente todo o conteúdo, seja gerado por IA ou por humanos, e não há evidências de que a IA leve a mais erros.”
“A maioria dos alunos não consegue dizer se uma frase foi escrita por um humano ou por IA, e não estamos vendo nenhuma atividade significativa de cancelamento de assinaturas,” disse o porta-voz. “Nosso estilo divertido e distinto continua sendo uma marca nossa — e isso também faz parte de como usamos IA para gerar conteúdo.”
O porta-voz também disse que não há planos para reduzir imediatamente o número de funcionários contratados, acrescentando que a empresa irá trabalhar com cada área para “entender as oportunidades e os prazos para cada equipe.”
Funcionários do Duolingo vêm utilizando modelos como o GPT da OpenAI para criar currículos desde 2023, mas os investimentos em “sistemas de conteúdo compartilhado” também foram fundamentais para a aceleração na criação de materiais, disse Klinton Bicknell, chefe de IA da empresa, em entrevista. Isso significa que o conteúdo de, por exemplo, uma aula de inglês será o mesmo, independentemente do idioma nativo do aluno. Anteriormente, o curso de inglês para falantes de francês era desenvolvido separadamente do curso para falantes de espanhol, explicou ele.
“No passado, quando isso era feito principalmente por humanos, havia trocas reais do tipo: é melhor usar nossos recursos humanos para criar um novo curso em alta demanda, ou para melhorar um curso que já temos?” disse Bicknell. “Mas no mundo da IA, podemos fazer os dois.”
Em vez de fazer humanos revisarem todo o conteúdo, a empresa agora usa seus funcionários para criar os dados que treinam a IA a fazer mais validações, afirmou Bicknell. Isso mudou a composição da equipe de criação de conteúdo. Além dos cientistas da aprendizagem que iteram sobre o que a IA gera, a empresa também contratou mais engenheiros e pesquisadores em IA para definir os parâmetros usados pela IA na avaliação dos conteúdos.
A empresa está “avaliando continuamente diferentes modelos,” além dos da OpenAI — incluindo opções da Anthropic, Google e até modelos open source — para decidir quais são os mais adequados para cada tarefa. Por exemplo, a equipe descobriu que o Claude, da Anthropic, era “muito melhor” em certos tipos de matemática, o que foi útil na criação de conteúdo para o novo currículo de matemática, disse Bicknell.
A IA generativa também ajudou o Duolingo a explorar novas áreas de aprendizado. Seu novo curso de xadrez, lançado em versão beta para alguns usuários de iOS na semana passada, surgiu de um protótipo criado por dois funcionários que não são engenheiros — um gerente de produto e um designer — usando a ferramenta de codificação Cursor AI. A equipe cresceu com a inclusão de engenheiros, e o desenvolvimento do curso continua altamente dependente de IA, já que a tecnologia será necessária para que o oponente virtual aprenda e acompanhe o nível de habilidade do usuário.

