Seg, 08 de Dezembro

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Saúde

Estudo mapeia como a psilocibina remodela circuitos cerebrais ligados à depressão

Descoberta abre caminho para muitas possibilidades terapêuticas, como evitar parte da plasticidade negativa e, em seguida, potencializar a positiva

Cogumelo Psilocybe semilanceata contém psilocibina, substância alucinógena Cogumelo Psilocybe semilanceata contém psilocibina, substância alucinógena  - Foto: Hans / Pixabay / Divulgação

Uma colaboração internacional liderada por pesquisadores da Universidade Cornell, nos EUA, usou uma combinação de psilocibina (componente psicoativo dos cogumelos mágicos) e o vírus da raiva para mapear como — e onde — o composto psicodélico reconfigura as conexões no cérebro. Eles demonstraram que a psilocibina enfraquece os circuitos de feedback córtico-cortical que podem prender as pessoas em pensamentos negativos.

O composto também fortalece as vias para regiões subcorticais que transformam percepções sensoriais em ação, essencialmente aprimorando as respostas sensório-motoras. As descobertas foram publicadas na revista científica Cell.

A psilocibina é uma candidata promissora para o desenvolvimento farmacêutico porque os ensaios clínicos mostraram que a droga pode reduzir os sintomas em pessoas com depressão por semanas e talvez até meses após um único tratamento.

O vírus usado no estudo foi criado por colaboradores do Instituto Allen de Ciências do Cérebro em Seattle para se mover e mapear o "diagrama de circuitos muito complexo" do cérebro, de forma semelhante aos carros de mapeamento do Google que percorrem todas as ruas de um bairro.

"Com a psilocibina, é como se estivéssemos adicionando todas essas estradas ao cérebro, mas não sabemos para onde elas levam", diz Alex Kwan, professor de engenharia biomédica na Cornell Engineering e autor principal do artigo, em comunicado. "Aqui, usamos o vírus da raiva para analisar a conectividade no cérebro porque esses vírus são projetados na natureza para se transmitirem entre neurônios. É por isso que são tão mortais. Ele pula uma sinapse e vai de um neurônio para outro."

Principais descobertas do mapeamento cerebral
Primeiro, os pesquisadores injetaram uma dose única de psilocibina nos neurônios piramidais do córtex frontal de um camundongo. Um dia depois, eles injetaram uma variante do vírus da raiva que podia se transmitir através de uma sinapse e marcar os neurônios conectados com proteínas fluorescentes.

Após o vírus incubar no camundongo por uma semana, a equipe fez imagens do cérebro e comparou os resultados com o cérebro de um camundongo controle que havia recebido apenas o vírus.

A marcação fluorescente revelou que a psilocibina enfraqueceu as conexões recorrentes dentro do córtex — circuitos de feedback que podem explicar por que uma pessoa deprimida se fixa em pensamentos negativos.

"A ruminação é um dos principais pontos da depressão, onde as pessoas têm um foco doentio e ficam remoendo os mesmos pensamentos negativos", explica Kwan. "Ao reduzir alguns desses ciclos de feedback, nossas descobertas são consistentes com a interpretação de que a psilocibina pode reconfigurar o cérebro para quebrar, ou pelo menos enfraquecer, esse ciclo."

Os pesquisadores também observaram que a área sensorial do cérebro se conecta mais fortemente à região subcortical, fortalecendo a ligação entre percepção e ação.

Implicações para futuras terapias
Inicialmente, a equipe esperava encontrar conexões entre uma ou duas regiões do cérebro, mas ficou surpreso ao descobrir que a reconfiguração causada pela psilocibina envolvia o cérebro inteiro.

"Estamos realmente analisando mudanças em todo o cérebro. Essa é uma escala com a qual não trabalhamos antes. Muitas vezes, nos concentramos em uma pequena parte do circuito neural.", pontua.

O extenso mapeamento das vias também mostrou que a quantidade de atividade neuronal no cérebro pode determinar o que é reconfigurado pela droga. Isso inspirou os pesquisadores a demonstrarem que, ao perturbar e manipular a atividade neural de uma região do cérebro, eles poderiam de fato alterar a forma como a psilocibina reconfigura os circuitos.

"Isso abre muitas possibilidades terapêuticas, como talvez evitar parte da plasticidade negativa e, em seguida, potencializar especificamente aquela que é positiva", conclui Kwan.

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