Tailândia repatriará quase 7 mil pessoas resgatadas de tráfico humano em fábricas de golpes online
Deste número, 5 mil são chineses e outros 2 mil se dividem entre duas dúzias de países
Cerca de 7.000 pessoas que eram forçados a trabalhar em fábricas de golpes online em Mianmar, serão repatriadas a partir da próxima semana, anunciou nesta sexta-feira o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Tailândia, Nikorndej Balankura. Elas foram resgatadas em operações contra o tráfico humano na fronteira entre Mianmar e Tailândia.
Desse número, 5.000 são chineses e outros 2.000 se dividem entre duas dúzias de países. Recentemente, os paulistanos Luckas Viana dos Santos, de 31 anos, e Phelipe de Moura Ferreira, de 26, conseguiram retornar ao Brasil após meses presos no sudeste asiático.
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O anúncio aconteceu após uma reunião entre representantes da Tailândia, Mianmar e a China para um acordo de repressão ao crime transnacional. Sob pressão de Pequim, Mianmar reprimiu algumas das células criminosas, libertando cerca de 7.000 trabalhadores de mais de duas dúzias de países.
Os chineses serão os primeiros repatriados desta leva. A partir da próxima semana, foi planejado o envio de 1.000 cidadãos semanalmente, informou Balankura.
As operações de fraude cibernética, que prosperaram nas áreas fronteiriças sem lei de Mianmar por vários anos, atraem trabalhadores estrangeiros com promessas de empregos bem remunerados, mas os mantêm reféns e os forçam a cometer fraudes online.
Os trabalhadores libertados estão agora definhando em condições às vezes miseráveis em campos de detenção perto da fronteira tailandesa, enquanto as autoridades organizam sua repatriação. Na semana passada, cerca de 600 cidadãos chineses foram devolvidos de Mianmar através da Tailândia - e escoltados para fora do avião algemados pela polícia no pouso.
Embora trabalhaores relatem que foram traficados ou enganados para aceitar o trabalho e que sofreram espancamentos e abusos, o governo da China até agora os tratou como suspeitos de crimes.
Os 2.000 estrangeiros restantes passariam por processos usuais de triagem tailandesa antes de serem entregues às suas respectivas embaixadas para possível repatriação.
As Nações Unidas estimam que até 120.000 pessoas - muitas delas chinesas - podem estar trabalhando em centros de golpes de Mianmar contra sua vontade.
Brasileiros resgatados
Dos Santos e Ferreira voltaram ao país há pouco mais de uma semana, desembarcaram no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.
Assim como nos outros casos, ambos foram atraídos por supostas vagas de emprego, mas acabaram forçados a realizar golpes virtuais sob ameaças e torturas em Mianmar.
— A gente veio para a Ásia com o sonho de um trabalho melhor, mas nosso sonho foi por água abaixo. Fomos vítimas de tráfico humano. Chegamos na Tailândia e fomos mandados para Mianmar, sofremos bastante lá. Graças a embaixada, ao Itamaray, ao governo da Tailândia (fomos resgatados) — disse Dos Santos, em depoimento na embaixada de Bangkok, antes de serem repatriados.
Conforme noticiado pelo Globo em dezembro do ano passado, Ferreira foi atraído por uma vaga de emprego na Tailândia cerca de um mês após dos Santos cair na rede de tráfico humano.
A oferta feita pela rede social dava conta de uma vaga emprego em um call center de Bangcoc, com salário de US$ 2 mil mais comissões e um cargo de líder em uma equipe. Com as passagens pagas pela suposta empresa, o brasileiro embarcou rumo à Tailândia, onde chegou no fim de novembro e ficou hospedado em um hotel.
A partir do dia 22 daquele mês, os familiares perderam o contato com o rapaz. A última localização do telefone do brasileiro indica que ele estava em uma estrada próximo a uma área de mata em Mianmar.
Já Dos Santos, que tinha experiência trabalhando em cassinos no Sudeste Asiático, onde atuava no atendimento a clientes brasileiros, se mudou para a Tailândia no mês de setembro em busca de novas oportunidades de emprego.
— A ideia era trabalhar em um cassino — diz a mãe do brasileiro, que, segundo ela, chegou a trabalhar em um hostel nos primeiros dias no novo país. — Foi aí que apareceu a vaga pelo Telegram. Ele iria trabalhar como intérprete de brasileiros. Ofereceram moradia, um salário equivalente a R$ 8 mil e um contrato de seis meses.
O local do emprego seria a cidade tailandesa de Mae Sot, que faz fronteira com Mianmar e está a seis horas de carro de Bangcoc. Assim como ocorreu com Phelipe, um motorista da suposta empresa foi buscar Luckas Viana na madrugada. No trajeto, aconteceram trocas de carro, e o brasileiro chegou a realizar trechos da viagem de barco, ultrapassando a fronteira.
Phelipe Ferreira e Luckas Viana ficaram mantidos no mesmo complexo de Mianmar em condições precárias, segundo fontes ouvidas pelo Globo.
Assim como outras vítimas de tráfico humano na região, eles foram obrigados a aplicar golpes virtuais em pessoas do mundo todo. Nesses locais, os estrangeiros são vítimas de torturas, envolvendo choques e agressões físicas. Ameaças de morte também são constantes.
Os brasileiros combinaram de fugir de sábado, 8 de fevereiro, para domingo, dia 9, por volta de 2h30 da manhã, junto a um grupo de 85 pessoas de diferentes países que também haviam sido pegas pela máfia.
Eles foram resgatados, com a ajuda da ONG internacional "The Exodus Road", por agentes do DKBA (Exército Democrático Karen Budista), um grupo insurgente de soldados oficiais.

