Sáb, 06 de Dezembro

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Câmara dos Deputados

Motta apresenta queixa de parlamentares a Lula sobre ritmo de liberação de emendas

Calendário virou tema recorrente nas conversas entre congressistas

Presidente da Câmara Hugo Motta mostrou queixas dos parlamentares presidente LulaPresidente da Câmara Hugo Motta mostrou queixas dos parlamentares presidente Lula - Foto: Ricardo Stuckert/PR

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), levou pessoalmente a Luiz Inácio Lula da Silva as queixas de congressistas sobre a lentidão nos pagamentos de emendas parlamentares e cobrou um cronograma previsível.

Segundo interlocutores, o petista prometeu “acelerar o fluxo”, mas não se comprometeu com prazos nem apresentou um calendário detalhado.

Embora o dinheiro reservado ao Congresso tenha aumentado nos últimos anos, a execução das emendas em 2025 é a menor, proporcionalmente ao total previsto, desde 2020.

Em um momento de desgaste do Palácio do Planalto com partidos de centro e em meio a um processo de reorganização da base, a lentidão na liberação da verba contribuiu, nas últimas semanas, para aumentar a insatisfação de deputados e senadores.

O descompasso virou tema recorrente nas conversas de Motta com líderes da base. Parlamentares relatam que o atraso tem provocado desgaste em redutos eleitorais e travado a interlocução com prefeitos, especialmente em cidades pequenas, onde as emendas representam a principal fonte de investimento local.

O presidente da Câmara foi direto com Lula: a incerteza sobre os repasses, segundo a sua visão, tem deixado o Congresso em “posição de espera” e reduzido a capacidade de articulação política do governo.

Os dados confirmam o mal-estar. Até 16 de outubro, o governo empenhou R$ 26,8 bilhões de um total de R$ 50,3 bilhões previstos no Orçamento, o equivalente a 53,3% da dotação.

Em 2024, no mesmo período, o índice era de 77,6%; em 2023, de 70%; e em 2022, ano eleitoral, chegou a 88,6%. A execução atual também fica abaixo da observada em 2021, quando o percentual foi de 56%, e só supera 2019 — primeiro ano da série analisada, quando as emendas de bancada ainda não eram impositivas.

Há três semanas, Motta já havia levado o mesmo recado à ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, em reunião com deputados do PT, PSB, PDT e PSD.

Parlamentares presentes dizem que Gleisi admitiu dificuldades internas para conciliar o ritmo das liberações com as metas fiscais, mas que se comprometeu a dar mais celeridade ao processo.

Em entrevista à jornalista Míriam Leitão na quarta-feira, na GloboNews, Motta reconheceu o desgaste e defendeu uma reconfiguração na relação entre os Poderes.

— Nós precisamos dar uma atualizada nessa questão da relação entre o Poder Executivo e a Câmara dos Deputados — afirmou.

O paraibano tem repetido a interlocutores que quer “baixar a temperatura”, mas também mostrar que a Casa não aceitará ser surpreendida por travas orçamentárias.

Enquanto as cobranças se acumulam, o Congresso tenta responder com regras próprias. O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026, Gervásio Maia (PSB-PB), incluiu no texto um dispositivo que obriga o pagamento, no próximo ano, de verbas destinadas à saúde, à assistência social e às transferências especiais (emendas Pix) em prazo máximo três meses antes da eleição. Essa obrigação não existe hoje.

Na prática, a mudança proposta garante que o dinheiro chegue às bases de governadores, prefeitos e parlamentares ainda no primeiro semestre, ampliando o uso eleitoral dessas verbas.

Hoje, não existe essa determinação de que todas as emendas sejam pagas antes da eleição, e o fluxo de repasses ocorre ao longo de todo o ano. Há, porém, uma proibição para a transferência de recursos a estados e municípios, incluindo emendas, nos três meses que antecedem o pleito.

Essa determinação existe justamente para evitar que os recursos sejam usados eleitoralmente, o que poderia gerar vantagens para um candidato em detrimento de outros. A mudança proposta busca obrigar o governo a enviar o recurso antes desse prazo.

A proposta, vista como uma reação direta ao cenário atual, tem apoio do Centrão e da Confederação Nacional de Municípios (CNM). O argumento é que prefeitos precisam de previsibilidade para executar as obras e mostrar resultados antes do pleito.

O Planalto, porém, resiste à tentativa de alteração legislativa. A equipe econômica alerta que a fixação de prazos pode engessar o Orçamento e comprometer o controle das contas em caso de queda de receitas.

O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), classificou a iniciativa como “totalmente eleitoral” e “sem lógica fiscal”. No entorno de Lula, auxiliares admitem que parte das liberações foi retida por precaução, diante da arrecadação abaixo do previsto e da pressão de gastos sobre o arcabouço fiscal.

Na Câmara, o tema virou combustível político. Deputados descrevem as emendas como “calmantes” que aliviam o humor das bancadas e garantem sobrevida ao diálogo com o governo. Sem elas, prefeitos e vereadores cobram os parlamentares — e o efeito chega ao Planalto. Líderes da base afirmam que o cronograma estaria pior que no comando de Arthur Lira (PP-AL).

Apesar das promessas de Lula, a expectativa entre aliados é que o ritmo só se normalize depois da votação da LDO, quando o governo buscará recompor pontes com o Congresso e reorganizar a articulação política.

Na última década, o Congresso turbinou o controle sobre o orçamento. Em 2015, em valores já corrigidos pela inflação, foram R$ 16,92 bilhões em emendas, frente a R$ 50,38 bilhões neste ano.

A mudança no modelo de repasses também contribuiu para esse novo cenário. Desde 2020, as chamadas emendas Pix — transferências fundo a fundo feitas diretamente aos cofres estaduais e municipais, sem necessidade de convênios ou planos de trabalho detalhados — ganharam espaço como principal forma de execução das emendas.

Essas transferências exigem menos etapas de prestação de contas e chegam mais rápido ao destinatário. Por isso, são preferidas por parlamentares e prefeitos. Ao mesmo tempo, estados e municípios têm falhado em prestar contas sobre a aplicação dos valores recebidos, o que vem gerando sucessivas cobranças do Supremo Tribunal Federal (STF).

As emendas também entraram no centro de um impasse entre Judiciário, Legislativo e Executivo em 2022, com o fim do orçamento secreto. No ano passado, o embate ganhou novos capítulos. Dino determinou a suspensão de repasses até que fossem criados novos mecanismos de transparência, o que aconteceu com a aprovação de uma nova lei. O Ministério Público Federal também abriu investigações pelo país centradas nas emendas Pix.

Porcentagem de emendas parlamentares empenhadas a cada ano até 16 de outubro:

2019  46,9% 

2020  60,7% (ano eleitoral)

2021  56,0% 

2022  88,6% (ano eleitoral)

2023  70,9% 

2024  77,6% (ano eleitoral)

2025  53,3%

Valores empenhados de emendas até 16 de outubro (valores não corrigidos)

2019 6.436.632.899.

2020 21.970.092.945 - ano eleitoral

2021 18.928.429.333

2022 22.866.685.033 - ano eleitoral

2023 25.407.251.573

2024 37.137.384.090 - ano eleitoral

2025 26.833.327.627

Dotação orçamentária de emendas por ano (valores não corrigidos)

2019 - 13.723.759.764

2020 - 36.177.357.007

2021 - 33.837.137.171

2022 - 25.799.146.216

2023 - 35.837.382.476

2024 - 47.870.483.927

2025 - 50.378.494.747

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