Racha no PSOL: direção não se opõe a Boulos ministro, mas ala minoritária cobra postura crítica
Resolução publicada pelo partido sobre governo do PT pouco antes da posse, em 2023, vira argumento para exigência de debate interno à luz de eventual convite
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A direção nacional do PSOL, comandada pelo bloco majoritário do qual Guilherme Boulos faz parte, não coloca obstáculos para que o deputado federal assuma o cargo de ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, caso o presidente Lula tenha planos maiores do que a sondagem revelada nesta terça-feira (6).
Internamente, o grupo liderado pela presidente nacional do partido, Paula Coradi, avalia que o posto seria uma forma de o partido "atender melhor os movimentos sociais", ainda que as conversas não tenham avançado desde então, ponderam interlocutores ouvidos pelo Globo.
Mas grupos de oposição dentro do PSOL alegam que Boulos deveria abrir um debate interno, por conta de resolução publicada pelo partido pouco antes da posse do petista.
O documento, intitulado “PSOL com Lula contra o bolsonarismo e pelos direitos do povo brasileiro”, estabelece que a sigla compõe a base do governo no Congresso, sem eliminar a possibilidade de divergir em temas específicos, como ocorreu de fato no arcabouço fiscal. Ao mesmo tempo, não teria cargos na gestão, com exceção feita à ministra Sonia Guajajara, que conduz a pasta destinada aos Povos Indígenas.
— Não estar no ministério possibilita o exercício da crítica, da diferença, às vezes de um voto contrário, sem que exista exigência em função dos cargos que se ocupa. É importante que as lideranças expressivas de movimentos sociais façam pressão de fora para dentro. Se Boulos e o PSOL se deslocarem para esse posto institucional, pode ser uma perda — afirma a deputada federal Sâmia Bomfim (SP), uma das que defendem consulta aos setores do partido à luz de um eventual convite.
Procurados, Boulos e Coradi não quiseram se manifestar sobre o assunto.
No momento, as “especulações” acerca da ida de Boulos ao Planalto, termo usado pelo integrantes do partido, ficam sob a guarda do próprio deputado e não foram tratadas de maneira formal no PSOL.
Sua eventual entrada no governo passa também pelo escrutínio de companheiros próximos. Uma das maiores preocupações está na condição alegadamente colocada pelo presidente Lula de que Boulos não dispute as eleições de 2026 e fique no cargo até o final do mandato — o que não é lido como “malícia” eleitoral, pois também vigoraria a outros titulares, como o petista Alexandre Padilha, que se licenciou da Câmara dos Deputados para assumir o Ministério da Saúde.
Candidato mais votado em São Paulo, com mais de 1 milhão de votos, Boulos ajudou a levar outros cinco parlamentares à Câmara e reforçou a bancada de 13 deputados do PSOL.
Os mais otimistas entendem que esse voto migraria naturalmente para parlamentares como Erika Hilton (SP), que ganhou apelo nacional ao apresentar a PEC da escala 6x1 e faz parte de seu grupo no partido.
Outros, por outro lado, entendem que Boulos consegue ampliar o eleitorado natural do PSOL, ainda mais após concorrer em duas eleições consecutivas a prefeito da capital paulista e chegar ao segundo turno. Foram gastos R$ 80 milhões na campanha em 2024, mais da metade vindos do caixa do PT.
Outra baixa no PSOL paulista no ano que vem será a ex-prefeita Luiza Erundina, que não deve concorrer a um novo mandato aos 91 anos. No horizonte eleitoral ainda está a cláusula de desempenho mais rígida, que exige 13 deputados federais eleitos, de nove estados diferentes, ou 2,5% do total de votos válidos em todo o Brasil, com no mínimo 1,5% em cada unidade da federação.
Caso esse patamar não seja atingido, o partido perde acesso ao fundo partidário e ao tempo de propaganda em rádio e TV. O PSOL teve 3,52% dos votos válidos no país na eleição passada, e Boulos sozinho respondeu por cerca de um quinto dos eleitores.
Ao chamar o ex-líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) para compor o governo na função que atualmente está sob os cuidados de Márcio Macêdo, Lula abriria, portanto, um novo flanco de disputa interna no PSOL, com a defesa do convite pelo bloco majoritário, que também conta com os deputados Talíria Petrone (RJ) e Ivan Valente (SP), e a oposição dos minoritários, aglutinados em torno de Glauber Braga (RJ), Sâmia Bomfim (SP) e Fernanda Melchionna (RS).
O tremor ocorre logo após o processo recente de cassação de Glauber, que teria ajudado a apaziguar os ânimos, com a bancada federal atuando de forma conjunta para defender o seu mandato publicamente.

