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"A torcida por um time não é estática", diz diretora de instituto de pesquisa

Especialista explica por que pesquisa divulgada pelo Globo é a mais ampla já feita para entender preferências e hábitos dos torcedores brasileiros

'A torcida por um time não é estática', diz diretora de instituto de pesquisa'A torcida por um time não é estática', diz diretora de instituto de pesquisa - Foto: Freepik

Entre 5 e 9 de junho deste ano, 2 mil pessoas com 16 anos ou mais foram entrevistadas em 132 municípios do Brasil. A "Pesquisa O GLOBO/Ipsos-Ipec - As maiores e mais fanáticas torcidas do Brasil" revelou os principais dados sobre os torcedores brasileiros, com recortes de raça, escolaridade, região e sexo. Márcia Cavallari, diretora do Ipsos-Ipec, esclareceu dúvidas sobre a metodologia e comentou os principais resultados na entrevista abaixo.

Quais são os desafios ao se fazer uma pesquisa sobre tamanho de torcidas?
As pesquisas relacionadas a futebol têm várias questões. Neste caso, trabalhamos com uma amostra da população com 16 anos e mais. Ela é representativa do país como um todo e é desenhada de forma com que as regiões e os estados estejam refletidos em suas respectivas dimensões. A gente distribui as entrevistas nas regiões, nos estados e, depois, seleciona probabilisticamente os municípios que vão fazer parte da amostra. Em seguida, sorteia por setores censitários. O entrevistador se desloca até esses setores e, lá, entrevista pessoas que cumpram as determinações de perfil que nós demos, com base no Censo de 2022 e na Pnad de 2023.

Como temos muitos times no Brasil, normalmente não divulgaríamos o resultado com casa decimal. Mas fizemos neste caso porque, se arredondássemos, ficaria tudo muito igual. Outro ponto é que cada resposta tem uma margem de erro específica em função da quantidade de respondentes, ou seja, calculada com a base efetiva de cada time.

 

Qual é a importância de a pesquisa ser realizada com questionários presenciais?
Nós sabemos que o acesso à internet não é universal e que pessoas com menos escolaridade e renda têm mais problemas de acesso. Se a gente faz a pesquisa on-line, não consegue ter uma amostra que represente a proporção de todos os segmentos da população.

 

Marcia Cavallari, diretora do Ipsos-Ipec Marcia Cavallari, diretora do Ipsos-Ipec // Divulgação

Torcedores por vezes questionam o campo de apenas 2 mil entrevistas. Por que ele consegue ser um retrato fiel do país?
A margem de erro depende do grau de confiança que se quer, do tamanho da amostra, dos resultados obtidos... Por isso calculamos a margem para cada time. No Brasil, duas mil entrevistas dão uma margem geral de dois pontos percentuais. Se faço uma pesquisa com três mil casos, a margem de erro será de 1,8. Ou seja, aumento em 50% as entrevistas para abaixar muito pouco a margem de erro. E aí entra o custo-benefício... Dois mil é um número bom, que dá uma margem aceitável e permite que você faça análises por segmentos.

A pesquisa também oferece uma avaliação qualitativa do torcedor. O que ela tem de inovadora e o que os dados nos permitem enxergar?
A gente está acostumado a ver apenas o ranking das torcidas. Nesta pesquisa, foram incluídas perguntas para entender melhor quão fanático o torcedor é, que tipo de sacrifício faz pelo time, se perder ou ganhar afeta seu humor... A gente está medindo profundamente o nível de envolvimento do torcedor. Nesse sentido, ela é a mais completa já feita.

O número de brasileiros que não torcem para time algum subiu de 24% em 2022 para 32,1% agora. O que pode explicar essa variação?
A gente não tem, na pesquisa, uma pergunta qualitativa para entender o não-torcedor. Pode-se levantar hipóteses: a variedade de opções de entretenimento que dividem a atenção das pessoas com o futebol, um desânimo pela ida de craques para o exterior, uma perda de interesse em função de resultados do próprio time ou da seleção brasileira...

Nenhum time cresceu acima da margem de erro de 2022 para cá. Perder torcedores é mais fácil que ganhar?
Torcer exige um vínculo emocional, e é mais difícil criar esse vínculo do que decidir não perder tempo com um time que não ganha. O aumento dos não-torcedores pode estar mostrando uma mudança cultural que acompanharemos ao longo dos anos. O futebol hoje compete com streaming, redes sociais e outros serviços. E a torcida por um time tem flutuações de um ano para o outro em função dos próprios campeonatos, dos desempenhos. Não é estática.

A pesquisa mostra que o torcedor mais fanático é o de escolaridade e faixa de renda mais baixas. É a prova de que o futebol ainda é popular?
Isso acontece porque a oferta de entretenimento é menor em função do poder aquisitivo mesmo. Enquanto isso, nas classes mais altas, o poder de consumo de outros tipo de entretenimento é muito maior. E outros esportes ficaram mais populares, como o vôlei, dividindo essa atenção (dos brasileiros).

Mais de 40% das mulheres não torcem para ninguém. É mais que o dobro dos homens. O que isso significa?
As mulheres sempre tiveram menos interesse. Ao longo do tempo, ele até aumentou. Mas não temos pesquisas tão antigas para comparar. Mesmo o futebol tendo uma característica mais masculina, pode-se dizer que mais da metade das mulheres torcem por algum time. Se tivéssemos dados mais antigos, veríamos que a participação era menor.

O que dá mais dor de cabeça: fazer pesquisas sobre futebol ou política?
As duas são as piores (risos). Porque a pesquisa acaba sendo um juiz que diz quem está na frente e quem não está, seja numa estimativa do tamanho das torcidas ou nas intenções de voto dos candidatos. É aquilo: quem fica em primeiro, fica feliz; quem não fica, reclama.

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