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EUA

Biden avalia conceder indultos coletivos para blindar atuais e ex-funcionários da Casa Branca contra

Presidente eleito dos EUA tem ameaçado processar democratas, funcionários eleitorais, agentes da lei, membros da Inteligência, repórteres, ex-membros de sua própria equipe e até republicanos que não o apoiam

Biden fala durante a 102ª Cerimônia Nacional de Iluminação da Árvore de Natal na Ellipse, em Washington Biden fala durante a 102ª Cerimônia Nacional de Iluminação da Árvore de Natal na Ellipse, em Washington  - Foto: Kevin Dietsch/ AFP

A equipe do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, está debatendo se ele deve conceder indultos múltiplos a uma série de inimigos do presidente eleito Donald Trump para protegê-los da “represália” que ele ameaçou após assumir o cargo, de acordo com pessoas familiarizadas com a discussão. A ideia seria estender preventivamente a clemência executiva a uma lista de atuais e ex-funcionários do governo por quaisquer possíveis crimes durante um período ainda indefinido de anos, efetivamente causando um curto-circuito na prometida campanha de represálias do próximo mandatário.

As autoridades da Casa Branca não acreditam que os possíveis beneficiários tenham de fato cometido crimes, mas estão cada vez mais preocupadas com o fato de que as escolhas de Trump para os principais cargos do Departamento de Justiça indicam que ele cumprirá suas repetidas ameaças de vingança. Mesmo uma investigação que não resulte em acusações pode se arrastar por meses ou anos, custando a essas pessoas centenas de milhares de dólares em honorários advocatícios e prejudicando suas perspectivas de carreira.

A discussão sobre indultos presidenciais múltiplos, relatada anteriormente pelo Politico, permanece principalmente na esfera administrativa, embora Biden tenha conversado sobre isso com membros seniores da equipe, de acordo com as pessoas familiarizadas com o assunto, que falaram sob condição de anonimato para descrever as deliberações internas. Isso ocorre depois que Biden perdoou seu filho Hunter para poupá-lo da prisão por acusações de porte de armas e evasão fiscal. A Casa Branca se recusou a comentar na quinta-feira.

Na prática, Biden previu a abordagem com o perdão de seu filho, eliminando não apenas as acusações pelas quais ele foi realmente condenado, mas também quaisquer crimes que ele “possa ter cometido ou participado” desde 2014. Isso presumivelmente impedirá que o Departamento de Justiça de Trump persiga Hunter Biden por quaisquer alegações que não mereceram acusações do promotor que o investigou desde o primeiro mandato de Trump.

Um ato de clemência tão abrangente, cobrindo até mesmo crimes hipotéticos ao longo de uma década, foi além do escopo de qualquer outro desde, pelo menos, a era Watergate, quando o presidente republicano Gerald Ford perdoou seu antecessor, Richard Nixon (do mesmo partido), por quaisquer crimes, embora ele não tivesse sido acusado no caso que revelou um esquema de escuta ilegal na sede do Comitê Nacional Democrata. Nunca antes um presidente havia concedido perdões múltiplos a funcionários do governo por medo de que um sucessor tentasse processá-los por vingança partidária.

Mas as escolhas de Pam Bondi, ex-procuradora-geral da Flórida, e de Kash Patel, ex-assessor de Trump e ativista de extrema direita, para chefiar, respectivamente, o Departamento de Justiça e o FBI no novo governo do republicano, colocaram a questão em primeiro plano. Patel prometeu “perseguir” os críticos de Trump e até publicou uma lista de cerca de 60 pessoas que ele considerava “membros do Estado profundo do Poder Executivo” como apêndice de um livro de 2023.

Os democratas do Capitólio têm pressionado Biden a fazer o possível para proteger os alvos de Trump. O deputado James E. Clyburn, da Carolina do Sul, um dos aliados mais próximos do presidente, pediu à Casa Branca que considerasse indultos preventivos logo após a eleição de Trump no mês passado e, da mesma forma, recomendou que o presidente perdoasse seu filho.

— Acho que há muitas pessoas que estão entrando no próximo governo e que estão nos dizendo quem são — disse Clyburn em uma entrevista na quinta-feira. — Eu vi Kash Patel dizer quem ele quer perseguir, então por que não devemos acreditar neles? E foi isso que eu disse à equipe do presidente: vocês precisam acreditar nessas pessoas.

Ele acrescentou:

— Acho que não seria uma atitude honrosa deixar este cargo e não fazer o possível para proteger a integridade da tomada de decisão deles, especialmente quando eles estavam cumprindo suas responsabilidades como patriotas deste país, fazendo o que é necessário para buscar uma união mais perfeita.

Ed Siskel, conselheiro da Casa Branca, está conduzindo as discussões como parte de um plano mais amplo para conceder indultos e comutações a beneficiários mais tradicionais, incluindo aqueles condenados por delitos não violentos relacionados a drogas, como é de praxe nos últimos dias de um presidente. Entre outros assessores que participam das discussões está Jeffrey Zients, chefe de Gabinete da Casa Branca.

No entanto, enquanto as autoridades da Casa Branca avaliam a questão, elas estão preocupadas com o fato de que tal medida alimentaria a impressão espalhada pela mídia conservadora de que os beneficiários realmente fizeram algo errado. Pelo menos alguns dos que seriam candidatos óbvios a esses indultos disseram em particular que não gostariam de recebê-los devido a essa implicação. Outros, preocupados com a retaliação, fizeram lobby para obter seus próprios perdões.

Entre as pessoas cujos nomes foram citados estão a ex-deputada republicana Liz Cheney, que foi vice-presidente da comissão bipartidária que investigou o papel de Trump no ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021; o Dr. Anthony Fauci, ex-especialista em doenças infecciosas do governo, cujo aconselhamento sobre a Covid-19 o tornou alvo de ataques da extrema direita; Jack Smith, o advogado especial que processou Trump; e o senador democrata eleito Adam Schiff, que foi um dos principais promotores da Câmara no primeiro julgamento de impeachment de Trump.

Cheney e Fauci não responderam aos pedidos de comentários. Schiff disse que não achava que indultos coletivos seriam uma boa ideia.

— Eu pediria ao presidente que não fizesse isso — disse ele à NPR recentemente. — Acho que isso pareceria defensivo e desnecessário.

Trump, que argumentou que os muitos processos criminais e civis contra ele fazem parte de uma ampla “caça às bruxas” que “transformou o sistema judiciário em uma arma”, fez pouco para disfarçar seu desejo de usar o sistema de aplicação da lei para se vingar de seus adversários. Ele ameaçou processar democratas, funcionários eleitorais, agentes da lei, membros da Inteligência, repórteres, ex-membros de sua própria equipe e republicanos que não o apoiam.

Ele disse nas mídias sociais que Cheney “deveria ser processada pelo que fez ao nosso país” e que toda a comissão do 6 de janeiro “deveria ser processada por suas mentiras e, francamente, por TRAIÇÃO!” Ainda segundo Trump, a vice-presidente Kamala Harris “deveria sofrer impeachment e ser processada”. Ele prometeu “nomear um verdadeiro promotor especial para perseguir” Biden e sua família, e sugeriu que o general Mark Milley, presidente aposentado da Junta de Chefes de Estado-Maior, merecia ser executado.

A própria lista de Patel de inimigos do “Estado profundo” inclui não apenas democratas, mas também ex-secretários nomeados por Trump que romperam com ele ou foram vistos como obstáculos, incluindo John Bolton, ex-conselheiro de segurança nacional; William Barr, ex-procurador-geral; Mark Esper, ex-secretário de Defesa; Pat Cipollone, ex-conselheiro da Casa Branca; Gina Haspel, ex-diretora da CIA; e Christopher Wray, atual diretor do FBI.

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