Chef Dário Costa, dos restaurantes Madê e Benedita (Noronha), se destaca pelo respeito ao mar
Natural de Santos, cozinheiro é voz cada dia mais potente na defesa da relação sustentável entre o homem e o litoral brasileiro
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De um intercâmbio para estudar inglês na Nova Zelândia, lá em 2008, aos 19 anos, quando lavava prato em restaurante para bancar as surf trips, até os dias de hoje, já chef de cozinha experiente e prestigiado, Dário Costa mudou muito. Mas nem tanto.
Nascido e criado em Santos, litoral paulista, tendo o surfe na Praia do Tombo e o mergulho vividos no cotidiano familiar, Dário se mantém profundamente conectado com o mar. E é aí onde começa a história da sua comida: na sua relação quase simbiótica com o oceano.
Noronha
Seja na Baixada Santista, em Bali ou Fernando de Noronha, ilha onde mantém, há três anos, o restaurante Benedita Cozinha Afetiva - o primeiro do arquipélago a ser citado em uma importante lista gastronômica (a casa abocanhou o 51º nos “100 Melhores Restaurantes do Brasil 2025” promovido pela revista Exame), o cozinheiro nutre um elo legítimo com as águas do mar.
Menu completo do Benedita Cozinha Afetiva aqui.
Costa tem uma noção (rara) de que o mar tem ritmo e tempo próprios, e deve ser respeitado enquanto bioma selvagem.
“O mar não é um ambiente controlado, você tem que se adequar a ele. O oceano é um lugar que a gente conhece pouco, que tem muito o que entregar pra gente, mas é ele quem dita as regras. Saber surfar essa onda é o grande desafio, sabe?”, pondera Dário.
Restaurante Madê, em Santos, é a primeira casa do chef Dário Costa. Foto: DivulgaçãoO Madê
Muito antes de o discurso de sustentabilidade do ambiente marinho virar moda no ramo de restaurantes, sua voz já ecoava de Santos para o Brasil, com a abertura da primeira casa, o Madê, em 2017.
É lá, na casa raiz, onde Dário Costa aplica 100% a lógica de cozinha em que acredita, completamente dedicada a peixes não convencionais (leia-se sem valor comercial, como guaivira, sororoca, abrótea) e frutos do mar trabalhados sob influência da principal escola teórica que rege suas criações, a Itália.
Foi no país do Velho Mundo, aliás, onde ele foi fisgado em definitivo pelo canto da gastronomia profissional. Estudou no Italian Culinary Institute (ICIF) e, em Santos, na Universidade São Judas. Da pia para o fogão foi um pulo quase.
“Sofri muita resistência (em relação aos pescados), hoje bem menos. Tudo valeu a pena. Tem cliente tirando onda, brincando com o nome dos peixes, saindo do restaurante querendo comer de novo. Estamos no caminho certo”, avalia o cozinheiro.
Brasa
Os menus do chef são sustentados em produtos de excelente qualidade, frescor, altas temperaturas (brasa e forno a lenha são suas paixões) e bases clássicas.
O que há de mais italiano do que o raciocínio ‘menos é mais’? A comida de Dário é objetiva, mas tem a sua origem como identidade, é extremamente bem executada e aposta quase tudo no potencial dos ingredientes.
No mais, todos os negócios de Dário são despojados e informais, como ele próprio.
Arroz de forno com mexilhão e peixe confitado, e minitemakis de atum do Madê. Fotos: DivulgaçãoNo início do ano, o Madê entrou na lista 50 Best Discovery, selo do grupo The World’s 50 Best Restaurants, que recomenda casas em todo o mundo que valem a pena ser visitadas off circuitos visados - aquelas para se ficar de olho.
Menu completo do Madê aqui.
Bolo de chocolate quente e cannolo com queijadinha do restaurante Madê, em Santos. Fotos: DivulgaçãoSantos volta
a bilhar
“Acho que a gente tá devolvendo Santos à rota (de turismo e gastronomia), já que nos anos 1980, havia a cultura de ir a Santos para se comer peixes e frutos do mar nos restaurantes tradicionais da cidade, principalmente o público de São Paulo”, resgata.
“A sensação de colocar Santos de volta à rota é muito massa, onde Santos merece estar. E é só o começo. A gente ainda vai fazer muito mais. Santos é uma cidade incrível, acolhedora, a Baixada Santista inteira tem muita coisa legal, merece ter protagonismo na gastronomia”, conclui o chef que tem mudado a direção dos mares brasileiros.
Ou melhor, seguindo e respeitando o fluxo da natureza. Além do Madê e do Benedita, ainda toca o Paru (menu aqui) e o restaurante da Deus Ex Machina no Brasil, além da peixaria Açougue do Mar.
Pingue-pongue com Dário
Pesca artesanal
ou industrial?
"Tanto a pesca artesanal quanto a industrial podem ser prejudiciais. O fato é que os órgãos que controlam e estabelecem as regras (no setor) deveriam estar em campo para entender de fato como as coisas acontecem para ser mais eficaz.
Acho que profissionais de vários ramos apedrejam a indústria como fosse uma única vilã, mas a artesanal também faz mal ao meio ambiente em determinadas ocasiões."
Poder
de mudança
"Ignoram o fato de que a indústria tem recurso para fazer a diferença, para investir em pesquisa, em técnicas de pesca menos nocivas. Não usar a indústria com uma aliada em mudanças concretas é um desperdício.
Enquanto o pescador artesanal tá lutando para sobreviver com as adversidades de ser pequeno, de viver em pequenas comunidades, não ter recurso nos defesos."
Por que usar
peixes não convencionais?
"Como eu sempre tive muito acesso aos pescadores, eles vinham em volume maior do que os peixes já que gente conhecia.
Comecei a me questionar o porquê de eles não serem usados, não estavam nas mesas.
E passei a entender questões culturais e técnicas, e tentei fazer coisas muito boas com eles, para que as pessoas nem lembrassem que talvez não gostassem ou não os conhecessem."
Impacto
imediato
"Entendi principalmente que essa era uma mudança de efeito imediato, porque esses peixes estão sendo pescados, estão sendo retirados do mar.
Se foi tirado do mar, a gente tem que usar. Tem que fazer jus ao trabalho, jus ao que o oceano nos deu.
Consumir esses peixes, dar valor a eles e gerar renda através deles é o primeiro passo.
O primeiro passo é usar o que o oceano nos dá e não ficar selecionando o que vai ser consumido."
Defina seu trabalho em uma frase
"Um trabalho verdadeiro, que não se preocupa em inventar a roda. A gente entende o que acontece de verdade e transcreve e imprime isso nos restaurantes"
SERVIÇO
Madê - Rua Minas Gerais, 93, Boqueirão, Santos - SP
Instagram: @madecozinha
Benedita Cozinha Afetiva - Rua São Miguel, 180, Fernando de Noronha - PE. Instagram: @benedita.noronha
Paru - Mercado do Peixe (Praça Almirante Gago Coutinho), Santos - SP. Instagram: @parurestaurante

