Seg, 08 de Dezembro

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PROTESTO

Carroceiros voltam a protestar contra o fim do transporte de tração animal

Carroceiros afirmam que não estão dispostos a "fazer acordo" para "abrir mão dos animais" e prometem mais protestos

Protesto dos carroceiros no Centro do Recife, na manhã desta segunda-feira (17)Protesto dos carroceiros no Centro do Recife, na manhã desta segunda-feira (17) - Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

No final da manhã desta segunda-feira (17), véspera da segunda etapa do censo dos condutores de tração animal residentes no Recife, os carroceiros voltaram a fechar vias da área central da cidade, no bairro da Boa Vista, em protesto ao cadastro.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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O censo tem o objetivo de identificar tutores e mapear a quantidade de cavalos e carroças, e é obrigatório para acessar os benefícios do Programa Gradual de Retirada de Veículos de Tração Animal.

O prazo para o cadastro vai até 10 de dezembro. No entanto, os condutores de tração animal afirmam que não estão dispostos a “fazer acordo” para “abrir mão dos animais” e prometem mais protestos e interdições.

O carroceiro Anderson Rodrigues, de 33 anos, afirma que a categoria rejeita a proposta de substituir as carroças por bicicletas elétricas que seriam pagas em parcelas.

“Estamos protestando porque a proposta foi de dar uma bicicleta elétrica aos carroceiros, que nem eu, que trabalho catando recicláveis, algo que dá um trocadinho todo dia, para a gente pagar em 60 vezes de 100. Como é que eu vou pagar? Aí vai levar meu cavalinho, que todo dia eu ganho dinheiro com ele, divido com ele, levo o pão pra dentro de casa, e me dar uma bicicleta para pagar 60 vezes de 100... Tem pessoas aí [carroceiros] que têm estudo, têm faculdade e estão desempregadas. Imagine eu e um bocado que somos analfabetos. Vamos viver de quê?”, questiona.

Segundo ele, os manifestantes consideram o cadastramento uma ameaça direta à subsistência das famílias. Anderson afirma ainda que seu cavalo é parte indispensável da rotina de trabalho e da renda da família. Ele explica que a categoria não aceita qualquer possibilidade de abrir mão dos animais, mesmo com ofertas financeiras.

“Sou nascido e criado com cavalo. Eu gosto muito de cavalo. Esse meu criei desde pequeno. Para mim, não tem preço vender ele, dar ele. Eu acredito que as pessoas que pegarem não vão cuidar como eu cuido. Eles querem dar R$ 1.200, isso dá para quê? Você vai no mercadinho, compra quase nada. Aí depois que acabar os 1.200, eu, que sou analfabeto, não tenho trabalho, não sei ler… vou viver de quê?”, alegou o tutor.

Durante o protesto, alguns carroceiros afirmaram que a retirada dos animais de circulação aumentaria os índices de criminalidade. Anderson reforça o argumento:

“A maioria aqui, assim como eu, também é analfabeto e não sabe ler nem escrever e também não teve oportunidade de emprego. Então, se tirarem os cavalos de todos os carroceiros o que eles vão fazer? Ou vão cair na rua para roubar, ou para traficar”, disse o carroceiro.

Anderson diz ainda que os casos de maus-tratos devem ser punidos individualmente, e não usados como justificativa para extinguir a atividade.

“Falam: ‘Ah, porque um carroceiro maltratou’. Tem que punir ele. Por causa de um, vai pagar todo mundo, é? É a mesma coisa se um Uber mata ou rouba, todos os Ubers vão pagar por aquele? Não. Tem que punir o que roubou”, afirma.

Anderson conclui dizendo que novos atos estão previstos até que se entre em acordo com a gestão municipal: “Vamos ter vários protestos ainda. Isso é só o começo”.

O que diz a Prefeitura do Recife
Em comunicado à imprensa, a Prefeitura do Recife reiterou que deu início ao programa de retirada dos veículos de tração animal e que começa nesta terça-feira uma nova rodada de cadastramento. Leia a íntegra:

"A Prefeitura do Recife informa que deu início ao Programa Gradual de Retirada dos Veículos de Tração Animal com o pagamento de indenizações e a concessão de benefícios pela entrega voluntária de cavalos e carroças. Neste mês de novembro, a gestão municipal já indenizou um primeiro grupo de carroceiros, além de destinar crédito para a compra de bicicletas elétricas e vagas de emprego na limpeza urbana da cidade. Os benefícios são concedidos conforme a escolha de cada condutor.

Os beneficiados participaram do primeiro ciclo do censo, realizado em junho. Nesta terça (18), a gestão municipal iniciará uma nova rodada de cadastramento, a fim de ampliar a participação de condutores e encaminhá-los aos benefícios do programa. 

Além das indenizações pela entrega voluntária do cavalo e da carroça, das vagas de emprego na limpeza urbana e das opções de microcrédito, o programa dará acesso a uma rede de qualificação profissional e apoio ao empreendedorismo, com a disponibilização de mais de 60 cursos profissionalizantes. Entre as opções, há formações para eletricista residencial, mecânico de instalação e manutenção de ar-condicionado e cabeleireiro básico".

Negociações
Sândalo Joaquim, líder do movimento, que se reuniu com os vereadores Eduardo Moura e Rodrigo Coutinho, alegou que acertou, em reunião na Câmara dos Vereadores, na manhã desta segunda-feira (17), que os vereadores vão investigar tudo o que está acontecendo em relação aos casos dos cavalos entregues pelos tutores que eles denunciam estar sendo negociados no Recife.

Sândalo afirmou ter provas, como fotos e vídeos, de cavalos sendo apreendidos e depois encontrados em feiras:

"Esses cavalos são apreendidos e depois negociados em feira, como a de Caruaru, e também há casos de cavalos que são retirados da rua por maus-tratos e levados para serem abatidos em outros locais. Nós já denunciamos ao Ministério Público os vídeos e fotos desses cavalos quando foram apreendido e quando foram vistos sendo renegociados depois de um tempo", contou o manifestante. 

O vereador do Recife, Rodrigo Coutinho, informou que recebeu relatos de que apenas cinco carroceiros puderam dar as suas carroças e os seus animais para receber a indenização. "Isso ainda é um número muito aquém do que a gente precisa atingir".

"A gente deixou claro que a questão da atração animal é irrevogável na nossa cidade, mas a gente também esclareceu que é preciso fazer algumas alterações importantes, como, por exemplo, a questão de autorizar os recifenses a criarem seu cavalo dentro dos seus próprios terrenos", explicou o vereador.

Horas depois, durante o período da tarde, os líderes do movimento foram recebidos na Prefeitura do Recife. A nova rodada de mediações não surtiu efeito e os carroceiros prometem novas movimentações.   

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